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O advento do consumidor engajado

A marca já não é uma questão só de marketing e vendas, tem a ver com o que é a empresa porque “quem ficar apenas preocupado com vendas pode vender mais hoje mas não vai vender mais no futuro”.

28 de Julho de 2021 às 11:00
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"O mistério do poder de uma marca é mais complicado do que o terceiro segredo de Fátima. Esse mistério tem a ver com um ainda maior que é mistério do que está dentro da cabeça do consumidor. Perceber por que é se lembra de uma coisa e não se lembra de outra, gosta de uma coisa mas não gosta de outra. E, depois de se lembrar e de gostar, muda de opinião às vezes por nada", disse Edson Athayde, CEO da FCB Lisboa. Como não é possível compreender o que vai na cabeça dos consumidores, a vida de um publicitário ou de um marketer é "perguntar, sondar, pesquisar, tentar descobrir, indagar, assuntar e estabelecer teorias".

Edson Athayde, que trabalha na publicidade em Portugal há 30 anos, traça a evolução das marcas e da relação com os consumidores. Começou de uma forma lateral: "além do que eu faço como marca, pode ser que eu queira fazer alguma coisa pela sociedade". Depois passou-se para: "no que faço é preciso que tenha em contao o que tenho de entregar para a sociedade". Hoje o consumidor não quer saber do que a marca faz, mas exige que a marca primeira entregue alguma coisa para a sociedade e, depois, o consumidor verá se gosta do que a marca entrega enquanto produto, serviço.

Mas Edson Athayde antecipa um futuro mais exigente para as marcas. Os estudos sobre as gerações pós-millenials mostram consumidores ainda "mais céticos, mais informados, mais exigentes, e que têm uma noção de que todo o consumidor é um cliente". Como diz Edson Athayde, esta conceção traduz-se no facto de um consumidor se sentir como "acionista do sucesso da marca". Por isso vai querer saber tudo sobre a marca: "não me minta, faça o que mando quando quero do jeito que eu digo e mesmo assim não sei gosto de você!".

Os dois universos

O presidente da FCB Portugal, que é um dos publicitários mais premiados em Portugal fala do "influenciador real" e do futuro um "consumidor engajado, que não é uma realidade total, representa uma parte só que esta é a tendência.". Caracteriza-o como o consumido que aceita o compromisso de ser cliente de uma marca, se se tornar leal pode tornar-se influencer no seu grupo social, porque tem acesso a um microfone, uma câmara, uma plataforma, que lhe dão poder e com um post ajuda a marca a vender mais ou leva-a à falência.

Mas este mundo em mudança não se reflete apenas nas alterações dos perfis dos consumidores mas atinge o interior das organizações. A marca já não é uma questão só de marketing e vendas, tem a ver com o que é a empresa. "Entre segunda e quinta no marketing e publicidade vive-se a tentar chegar ao coração das pessoas, mas na sexta alguém bate à porta e pergunta: ‘como é que isso vai ajudar a vender mais?’", afirma Edson Athayde.

Na sua opinião tem de se conseguir navegar nestes dois universos até porque há a consciência disseminada, em quem trabalha em marketing e publicidade hoje, que "quem ficar apenas preocupado com vendas pode vender mais hoje mas não vai vender mais no futuro". O trabalho hoje é como conseguir cruzar estes universos "Vamos conseguindo mas não há uma resposta concreta. Para algumas marcas tenta-se cruzar com causas sociais de vez em quando. Não há uma resposta concreta e única", conclui Edson Athayde. 

Além do que eu faço como marca, pode ser que eu queira fazer alguma coisa pela sociedade Edson Athayde
CEO da FCB lisboa
"Novo consumidor é muito cético exigente e desconfiado" "Sinto muitas vezes que acordei no reino da Bela Adormecida, passaram cem anos todos os anos e estamos sempre em atraso com tudo o que temos de aprender e absorver. São tempos muito desafiantes para os markteers, para todas as pessoas e para as marcas que têm uma dimensão mais holística", diz Isabel Rodrigues. Um dos aceleradores da mudança é um novo tipo de consumidor que é muito cético, exigente e desconfiado. Já não basta parecer. Temos de cumprir com aquilo que parecemos".

Esta exigência de verdade e autenticidade também tem de ser interiorizada não só pelas marcas como pelas suas organizações. Como exemplifica Isabel Rodrigues, "não acredito nessa modalidade de usar embaixadores para comunicar uma marca. O nosso propósito é transformar os nossos consumidores de ocasionais em leais e esses sim vão ser os verdadeiros embaixadores".

Segundo Isabel Rodrigues, "as marcas já não falam apenas com os consumidores, falam de uma forma geral com todos os stakeholders. Estamos a caminhar para uma visão muito mais holística e ética do que é o valor das marcas. Vamos deixar de olhar para as marcas apenas pelas campanhas ou pelo que dizem e muito menos pelo número de likes que têm, e olhar sobretudo para a sua autenticidade, flexibilidade, capacidade de adaptação, essência".