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Mecanismos de apoio: “Falta divulgação e adequação às necessidades das autarquias”

Colaboração entre municípios ainda é um entrave na aceleração da transição climática, mas sinergias seriam muito positivas. Ainda falta planeamento e capacitação. Apoio das Comunidades Intermunicipais é fundamental.

15 de Junho de 2023 às 16:00
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O caminho para a redução das emissões de CO2 tem de ser planeado e estruturado. A mensagem, deixada por Catarina Frazão, partner da Get2C, identifica a dificuldade que muitos municípios sentem na definição das suas estratégias de descarbonização, mas aponta os passos que devem seguir. Para esta responsável, as autarquias sentem-se muitas vezes perdidas entre uma panóplia de desafios de caráter urgente, para os quais não estão preparadas. "Falta divulgação dos mecanismos de apoio a que podem ter acesso e, por vezes, estes não estão adequados às necessidades dos municípios", afirma. O papel do poder central é aqui muito relevante, acredita a responsável, mas cabe igualmente às autarquias fazer um esforço de capacitação das suas equipas para que possam dar resposta a estes desafios.

A partilha de ideias e de experiências com outras autarquias é também, na opinião de Catarina Frazão, muito valiosa, uma vez que permite acelerar o esforço conjunto para um objetivo que é também de todos. No entanto, esta colaboração nem sempre é efetiva e eficaz, como ficou claro no painel que abriu a tarde na conferência "Autarcas pelo Clima", moderado por Luís Costa. Em jeito de desafio, o partner da Get2C questionou os participantes sobre que estratégia de mobilidade faz sentido o país ter, nomeadamente como assegurar a interligação de redes pedonais e ciclovias entre municípios, quando, muitas vezes, existe uma certa "competição" entre as diferentes autarquias. "Um dos erros é não perceber que as questões e os desafios são transversais aos vários municípios", aponta Joana Balsemão. Na opinião da vereadora do ambiente da Câmara Municipal de Cascais, "é preciso apoio do Estado central para dar resposta aos desafios climáticos, mas é necessária uma articulação regional entre municípios, e entre estes e o governo central". Rui Rei, presidente do Conselho de Administração da Parques Tejo, empresa responsável pela gestão do estacionamento no concelho de Oeiras, concorda e complementa: "Há um conjunto de conceitos que é preciso mudar." Ambos reconhecem, contudo, que entre os dois municípios que representam, tem sido feito um esforço de cooperação para endereçar os desafios da mobilidade.

A evolução, concordam os participantes, faz-se passo a passo, apesar de reconhecerem que o tempo para a mudança escasseia e que é preciso acelerar. Joana Balsemão recorda que a mobilidade no concelho de Cascais representa 50% da pegada de carbono, mas lembra igualmente que nos últimos anos, a autarquia conseguiu aumentar em 25% a utilização dos transportes públicos, nomeadamente, através da gratuitidade para os munícipes. Já durante a manhã, o presidente da edilidade, Carlos Carreiras, enumerara este exemplo pelo seu forte impacto na descarbonização do concelho, mas também pelo impacto social que teve. "Foi uma medida muito importante no combate ao isolamento da população mais idosa que, muitas vezes, não saía de casa por não ter meios financeiros para se deslocar, e que com esta medida ganhou nova vida", disse.

Em Oeiras, como revela Rui Rei, existe um orçamento de quatro milhões de euros por ano para financiar os passes, com o objetivo de reduzir a percentagem daqueles que diariamente se deslocam dali para Lisboa em veículos automóveis privados e que, atualmente, é de 55%. Outro esforço que a autarquia tem feito e, nas palavras do administrador da Parques do Tejo, "com sucesso", é a criação de condições de atratividade para que mais empresas se instalem no concelho. "Oeiras representa o segundo PIB nacional e tem grande atratividade para as empresas", salienta.

Já no que se refere a transportes públicos, Rui Rei refere a relevância de projetos como o LIOS - Linha Intermodal Sustentável -, aprovado pelas autarquias de Lisboa, Oeiras e Loures, e que prevê a criação de um metro ligeiro de superfície que ligará os três concelhos. O objetivo será melhorar a conetividade entre os territórios.

O responsável da Parques do Tejo refere igualmente o exemplo do Sistema Automático de Transporte Urbano (SATU), um projeto lançado por Isaltino Morais em 1997 e que, "estava à frente do seu tempo". Agora, o município pretende recuperar o transporte que previa, desde a sua génese, a ligação do comboio ao TagusPark e ao Cacém, tirando partido dos programas de financiamento disponíveis. Em breve, diz o responsável, "teremos novidades, uma vez que o plano de mobilidade de Oeiras foi apresentado há dias".

Falta de competências adequadas atrasa planos

Assoberbadas de desafios relacionados com as metas da neutralidade carbónica, muitas autarquias sentem dificuldade no momento de definir e de concretizar as suas estratégias rumo à descarbonização. Fabíola Oliveira reconhece que, na Câmara Municipal de Viana do Castelo, onde é vereadora, "tivemos alguma dificuldade na definição do plano municipal, mas contámos com a ajuda da Comunidade Intermunicipal (CIM) do Alto Minho". O grande problema, assume, passa pela falta de uma estrutura bem definida para a construção do plano. "Não existe um guia, ou um alinhamento, e fica à responsabilidade do município seguir um modelo próprio de acordo com o que pretende atingir", critica a vereadora.

Hugo Mesquita, da Câmara Municipal de Famalicão, partilha a opinião de Fabíola Oliveira, e acrescenta: "Falta competência interna nos municípios para estas áreas e para um desafio tão forte." No entanto, salienta igualmente a importância da sensibilização dos munícipes para a mudança de comportamentos. "É prioritário porque sem o compromisso das pessoas não será possível atingir os objetivos." Por outro lado, refere ainda o interlocutor da Câmara Municipal de Famalicão, a dispersão dos territórios é um enorme obstáculo que dificulta ainda mais a definição de planos em várias áreas. "O desafio energético deve ser encarado numa perspetiva de kick-off para a criação de Comunidades de Energia Renováveis (CER), fundamentais nestas regiões", defende.

O primeiro passo na definição de um plano de redução de emissões de CO2 num município passa por conhecer as emissões atuais e prever as futuras. Sem esta informação não será possível definir metas e objetivos concretos e ajustados. Catarina Frazão
Partner da Get2C
No que se refere ao financiamento, a vereadora de Viana do Castelo assume que a autarquia que representa procura tirar partido de todas as oportunidades disponíveis e fazer as candidaturas que façam sentido para a região. Já o representante da Câmara de Famalicão aponta a falta de apoio que sente para que os incentivos cheguem ao público final. "Sentimos que não existe apoio e instrumentalização de cima para baixo, que permita que estes incentivos estejam efetivamente ao dispor de quem deles necessita."

Planear o caminho

Em jeito de recomendação, Catarina Frazão partilha os passos que considera essenciais na definição de um plano de redução de emissões de CO2 num município. Em primeiro lugar, aponta, é fundamental conhecer as emissões atuais e prever as futuras. Sem esta informação não será possível definir metas e objetivos concretos e ajustados. Feito este levantamento e apurados os objetivos, a responsável da Get2C aconselha que sejam identificadas as ações e as iniciativas que pretendem concretizar. Por último, mas não menos importante, é necessário identificar as fontes de financiamento disponíveis e definir a forma como a sua aplicação será monitorizada. Uma receita que, apesar de parecer simples, na realidade é um processo muito exigente, pois "é um esforço que tem de ser corretamente direcionado", diz.

Por um lado, terá de existir, por parte dos municípios, uma preocupação de alocar um maior esforço nos setores com mais emissões, identificando as iniciativas já realizadas no município, e pesquisando as opções alternativas mais adequadas à sua realidade. Antes da decisão final sobre as opções mais viáveis, Catarina Frazão recomenda que seja feita uma análise SWOT ou de custos/eficácia, para garantir que a aposta é a mais correta.