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José Bourdain: “Não é com pirilampos mágicos que as Cercis sobrevivem”

Estado deve fornecer os recursos necessários e pagar um valor justo às instituições particulares de solidariedade social. Não ter fins lucrativos não significa que não se tenham prejuízos acumulados e não se fechem as portas, como já aconteceu com muitas instituições.

02 de Março de 2022 às 14:00
José Bourdain, presidente da Cercitop Mariline Alves
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A economia social promove a sustentabilidade através da inclusão social, da promoção da igualdade de oportunidades. É uma área crucial na proteção social em todo o território nacional, seja na área da saúde, educação ou do apoio à terceira idade. Este foi o ponto de partida da talk Sustentabilidade e Economia Social, realizada no âmbito do projeto Portugal Inspirador, uma iniciativa do Jornal de Negócios e do Correio da Manhã em parceria com o Banco Santander.

A talk começou com a explicação do nome Cercitop, em que top quer dizer "todo o país", o que revela a ambição de um projeto cooperativo criado em 1999 em Sintra. Resulta da iniciativa de José Bourdain, presidente da Cercitop, e de alguns colegas de trabalho, todos eles pais de utentes com deficiência mental e multideficiência que estavam num colégio privado que estava a passar uma fase complicada, o que obrigou a criar alternativas. A cooperativa tem perto de 240 colaboradores e cerca de 1.700 utentes, com tendência para crescer nos próximos dois ou três anos, graças ao PARES (Programa de Alargamento da Rede de Equipamentos Sociais) e ao PRR, que tem 205 milhões de euros para unidades de cuidados continuados.

Negócios lucrativos amparam finalidade social

A componente principal da atividade da Cercitop é social, não tem fins lucrativos, mas "tendo em conta que o Estado normalmente não paga o suficiente para garantir a sustentabilidade das organizações particulares de solidariedade social, criámos empresas privadas com fins lucrativos no âmbito da Cercitop, que permitem sustentar a componente social", disse José Bourdain.

É o caso da Cerci Transportes, que é uma empresa de rent-a-car e aluguer de transportes para pessoas com deficiência, com motorista. Têm ainda a Tourism For All, uma agência de viagens e operador turístico especializado no turismo acessível, de saúde, bem-estar e médico, de que Stephen Hawking chegou a ser um dos clientes.

Estas empresas existem também porque no Estado se continua a pensar "que este setor deve viver de donativos e de apoios das empresas e do mecenato, mas ninguém pode fazer um orçamento com base em possíveis donativos. Não é com pirilampos mágicos que as Cercis sobrevivem e conseguem fazer um trabalho sério, continuado e profissional", afirma José Bourdain. Na sua opinião, o Estado deve fornecer os recursos necessários e pagar um valor justo, "porque não ter fins lucrativos não significa que não tenha prejuízos acumulados e não feche a porta, como já aconteceu com muitas instituições".

O aumento dos custos

Entretanto, as IPSS como a Cercitop queixam-se de um aumento constante dos custos, desde os aumentos do salário mínimo e da TSU às alterações legislativas com mais exigências e mais custos, como rácios de pessoal mais elevados, a necessidade de acautelar impactos ambientais e energéticos. "Mas em contrapartida a comparticipação do Estado quase não cresce, como nos cuidados continuados em que o Estado pratica os mesmos valores desde 2011, ou quando cresce, como aconteceu com os idosos e a deficiência, cresce muito pouco em comparação com o aumento de custos que entretanto se verificou", refere José Bourdain.

O presidente da Cercitop receia que o PRR no âmbito social não vá ter o impacto que se prevê porque as contas "estão mal feitas". Explica que o custo atual da construção por metro quadrado é o dobro do usado no programa PARES, que foi calculado antes da crise pandémica. Por isso, antevê que muitas instituições, até com projetos aprovados, desistam destes porque não têm capacidade financeira para os executar.