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As memórias de Xavier de Basto, o pai do IVA

Uma conversa do músico e compositor, Pedro Abrunhosa, com o professor jubilado de fiscalidade, José Guilherme Xavier de Basto, em torno do imposto de valor acrescentado.

10 de Maio de 2024 às 15:00
José Guilherme Xavier de Basto conversa com Pedro Abrunhosa Ricardo Almeida
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"Não renego a paternidade quando dizem que sou o pai do IVA (Imposto sobre o Valor Acrescentado), que entrou em vigor em 1 de janeiro de 1986. É um filho um bocado espúrio, mas é garantia dos ordenados da função pública e das pensões. Não é uma glória, porque é um assunto muito aborrecido, que dá trabalho. A matéria fiscal é cheia de pormenores, de detalhes, de escaninhos, é uma coisa muito aborrecida", afirmou José Guilherme Xavier de Basto, 85 anos, que foi professor de Fiscalidade e de Harmonização Fiscal na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra e presidiu à Comissão do Imposto sobre o Valor Acrescentado (1980-1985).

Em conversa com o músico e cantor Pedro Abrunhosa, Xavier de Basto sublinhou que é um mal-amado por causa do IVA. "Na criação do IVA, tínhamos restrições em relação às taxas reduzidas e pusemos a taxa normal nos livros, que era só de 16%, que na altura era brandinha e depois subiu e subiu… Fui à feira do Livro do Porto e comprei um livro e o vendedor diz-me: "afinal o senhor também gosta de ler"…, recordou Xavier de Basto, que é um colecionador e apreciador de canetas de tinta permanente.

A revista Playboy

Lembrou que em 1986 o IVA comportava taxas agravadas para determinados produtos, o que hoje a legislação europeia não permite. Na época, a lista foi feita "com base nos bens que cada um dos membros da comissão embirrava. Eu que odeio armas de fogo, disse ponha armas de fogo. Passados uns dias recebi uma carta indignada da Federação Portuguesa de Tiro porque tínhamos ganho um medalha da prata nos Jogos Olímpicos e era um crime lesa-pátria".

"A situação mais grave foi com a taxa agravada sobre artigos pornográficos, porque não havia definição do que fosse artigo pornográfico. Entrou em vigor e os contribuintes mandavam amostras de artigos para um diretor que era um homem católico, austero… Mas consegui que ele não considerasse, como pornográfica, a revista Playboy", referiu Xavier de Basto, sempre com a ironia a pontuar o seu discurso.

Recusou a ideia de um fiscalista tem de ser alguém que não gosta de música, de arte ou de poesia porque no seu caso é um apaixonado de música e de ópera e na sua última aula na faculdade de Economia da Universidade de Coimbra em 2004 citou os versos de Álvaro de Campos "queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?".