Outros sites Medialivre
Notícia

António Pires de Lima: “Existe uma cultura que não premeia o mérito”

António Pires de Lima diz que “são as empresas que produzem riqueza”, Jorge Rebelo de Almeida frisa que as subidas salariais não devem ser generalizadas e Gonçalo Moura Martins frisa que as economias modernas são as puxadas pelas empresas.

04 de Agosto de 2022 às 15:30
Pedro Ferreira
  • Partilhar artigo
  • ...
Foto em cima: Francisco Cary, administrador da Caixa Geral de Depósitos, Gonçalo Moura Martins, CEO da Mota Engil, António Pires de Lima, CEO da Brisa e Jorge Rebelo de Almeida, presidente do grupo Vila Galé, participaram num painel moderado pela diretora do Jornal de Negócios, Diana Ramos.

"Fico preocupado quando oiço alguém a falar em trabalhar quatro dias por semana, em aumentar salários, e ninguém a falar do mérito, da produtividade." O desabafo é de Jorge Rebelo de Almeida, presidente do Grupo Vila Galé, no painel Empresas, no âmbito Encontro Fora da Caixa "Os desafios da Economia e a Importância do Emprego", uma iniciativa da CGD em parceria com o Negócios, que decorreu na Escola Náutica Infante D. Henrique, em Oeiras.

"Se na minha empresa subisse generalizadamente o salário, sem critério nenhum, apenas aumentar por aumentar, eu não só não melhoro nada, só melhoro um bocadinho pela injeção de mais dinheiro na economia. Fico na mesma ou talvez pior, porque vou gerar um sentimento de desconforto para os que trabalham mais se essas pessoas não forem premiadas", concluiu o gestor hoteleiro para quem é fundamental "premiar a diferenciação, o mérito, o esforço e o empenho".

Como numa estafeta, António Pires de Lima, presidente executivo da Brisa pegou no testemunho de Jorge Rebelo de Almeida e apontou a existência de "uma cultura que não premeia a meritocracia". O também ex-ministro da Economia salientou que "são as boas empresas, as que têm lucros, que têm mais possibilidades de pagar melhores salários". Em Portugal, observou António Pires de Lima, quando uma empresa apresenta lucros fortes são considerados "obscenos e devem ser taxados com uma taxa especial". "O bom é termos um universo constituído só por pequenas e médias empresas. Mas, uma cultura destas, o que propicia é um sistema empresarial onde as pessoas têm vergonha de ganhar dinheiro", sublinhou.

A economia das empresas

António Pires de Lima destacou que "são as empresas que têm modelo de sustentabilidade, que produzem riqueza, que têm valor acrescentado bruto grande, que apresentam lucros, que têm obrigação e podem pagar salários mais altos". O CEO da Brisa defendeu que a mudança da estrutura salarial é "não só necessária, como, do ponto de vista político, é uma discussão central". Mas alertou que tem ser "baseada numa cultura que ponha a competitividade, o crescimento, a valorização das empresas" e a criação de modelos de negócio com o valor acrescentado bruto, que é o indicador da produtividade prioritário das empresas.

Para o gestor, em vez de se valorizar o paradigma das empresas grandes e boas, privilegia-se o "exemplo do que é pequeno". "Algumas dessas empresas até poderiam desaparecer para dar lugar a modelos de negócio mais rentáveis e sustentáveis e que tivessem como objetivo pagar melhor às pessoas", afirmou.

Na mesma linha, Gonçalo Moura Martins, presidente executivo da Mota-Engil, defendeu que as economias modernas são economias de empresas e que estas é que fazem a economia de um país. "O reflexo, a ambição que conseguimos imprimir ou queremos ter como visão de uma sociedade, é transposto para vida e a dinâmica das empresas. Um contexto que não alimente o crescimento das empresas, o mérito, os bons exemplos, é uma sociedade que não cuida de si própria. Só as economias sustentadas por grandes empresas é que têm futuro", considerou.

Já o administrador da Caixa Geral de Depósitos Francisco Cary defendeu que só com mais crescimento económico as empresas se desenvolvem mais e pagam melhores salários. O gestor contribuiu ainda com a análise ao universo empresarial português, considerando que, de um modo geral, a "situação das empresas hoje é muito mais robusta do que era há dez anos". "Tem alguns constrangimentos mas do ponto de vista das competências, que estão mais viradas para competir no exterior e, em termos relativos, mais capitalizadas."

Vida digna e a demografia

Uma vida digna para os portugueses e o problema demográfico em Portugal foram temas colocados em cima da mesa por António Pires de Lima e Jorge Rebelo de Almeida, que apontou como "desígnio extraordinário, mas a que ninguém liga, de melhorar a qualidade de vida das pessoas". Sobre a precariedade no trabalho, referiu que o grupo hoteleirto emprega mais de 4.000 pessoas e que o grande problema dos jovens "não é precariedade, mas sim a habitação", o que na sua opinião tem efeitos na natalidade porque "há menos condições para fazer filhos porque está tudo difícil desde as creches à educação".

Quando questionado sobre o que representa o facto de o rendimento médio anual bruto ser de 9.665 euros, de acordo com dados do INE, António Pires de Lima afirmou que este dado mostra que Portugal é um país onde "a maioria das pessoas, apesar de trabalhar e trabalhar muito, não têm através do seu trabalho acesso a uma vida digna", e "é um tema central", quer na agenda política quer na empresarial.