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Algarve para todo o ano

Para Desidério Silva, a preocupação principal está em alargar a época turística de Outubro a Maio, porque na época alta a taxa de ocupação já está acima dos 90%.

22 de Junho de 2018 às 12:50
André Veríssimo moderou a conversa com Bernardo Trindade, Desidério Silva, Hélder Brito Carrasqueira e Rodrigo Machaz. Filipe Farinha
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"Tenho-me recusado a falar de época alta, ou baixa, procuro falar de um Algarve todo o ano", referiu Desidério Silva, presidente da Região de Turismo do Algarve. "Em termos de indicadores, como dizemos, a época alta do Algarve está feita e este ano vai ser muito semelhante ao do ano passado. O nosso esforço é o que fazemos a partir de Outubro até Maio. Este período é que precisa do esforço da região".


53%
Taxa de ocupação
Em Portugal, este indicador passou de 39% em 2005 para 53% em 2017


"Partimos de uma base e de uma diferença muito grande, que é uma época alta com taxas de ocupação acima dos 90% e uma época baixa com taxas entre os 25 e os 30%. Em 2015 tínhamos uma taxa de ocupação de 49 a 50% e, no ano passado, conseguimos 65%, em termos anuais", explicou Desidério Silva. E registaram-se as quebras das operações aéreas da Monarch, Air Berlin e Nikki. "O nosso foco principal tem de ser de Outubro a Maio, e se conseguirmos captar mais gente, faz com que a taxa de ocupação anual seja muito superior".

Podemos dizer que o Algarve é a melhor região turística e de grande diversidade mas nos temos é de convencer os mercados emissores de turistas. Desidério Silva
presidente da Região de Turismo do Algarve

As ligações e as novas rotas são um esforço que está a ser feito pelo Turismo de Portugal, secretária de Estado, Aeroporto de Faro, Região de Turismo, Associações, mas só se consegue convencer os operadores turísticos e as companhias aéreas se houver produto e oferta turísticos e se os hotéis estiverem abertos e os restaurantes a funcionar. "Quando se fala da sazonalidade, faltam piscinas cobertas no Algarve, dito por vários operadores", aduziu Luís Carmo Costa, CEO da Neoturis. "O nosso foco é conseguir que de Outubro a Maio haja uma oferta qualificada, diversificada", refere Desidério Silva.

Requalificação hoteleira

"Podemos dizer que o Algarve é a melhor região turística e de grande diversidade, mas nos temos é de convencer os mercados emissores de turistas", sublinha Desidério Silva. Acrescenta que "de fora, a percepção que se tem da região é muito positiva e, por isso, temos de a manter, porque pode fazer toda a diferença, numa altura em que os outros mercados estão a valorizar-se e a ter outra forma de comunicação". Mas não deixa de observar "que não se pode competir pelo preço, mas é possível competir pela qualidade de serviço e da oferta. Sermos simpáticos e hospitaleiros e ter uma oferta de qualidade".

Quando se fala da sazonalidade, faltam piscinas cobertas no Algarve, segundo vários operadores. Luís Carmo Costa
CEO da Neoturis

Para o presidente da Região de Turismo do Algarve, "há muito trabalho a ser feito pelas entidades públicas e pelos empresários". Na sua opinião, o Algarve não precisa de mais hotéis mas da requalificação de vários hotéis na região, para melhorar a qualidade da oferta e oferecer um patamar acima de qualidade.

"Está-se a ganhar dinheiro há quatro anos, por isso está na hora de investir na requalificação e modernização, como alguns hoteleiros fizeram e outros estão a fazer", assinalou Luís Carmo Costa, CEO da Neoturis.

Referiu ainda a questão da formação e da qualificação. "As universidades, os politécnicos, as escolas hoteleiras estão a fazer um grande trabalho, em conjugação com os empresários, mas é uma das áreas em que tem de haver uma intervenção maior, porque não podemos ter os melhore hotéis e restaurantes se não tivermos as melhores pessoas qualificadas e com formação", concluiu Desidério Silva.

Os investimentos públicos

Entre as principais infra-estruturas necessárias estão a requalificação da EN125, entre Olhão e Vila Real, e a electrificação da linha ferrovia.

"Tivemos mais dormidas de estrangeiros no Algarve que Lisboa e Porto somados. O que dá ideia da relevância da região. Somos a principal região turística de Portugal, a que mais receitas e proveito tem e isso deve-se ao esforço daqueles que no terreno procuram ter essa oferta. Por isso é importante que as infra-estruturas públicas tenham um acompanhamento porque podemos ter os melhores hotéis do mundo mas depois temos de ter infra-estruturas", salientou Desidério Silva.

Tivemos mais dormidas de estrangeiros no Algarve que Lisboa e Porto somados Desidério Silva
presidente da Região de Turismo do Algarve


As principais infra-estruturas necessárias são, sobretudo, a requalificação da EN125, entre Olhão e Vila Real, a electrificação da linha ferrovia, e a ligação férrea entre Faro e o aeroporto de Faro, um intermodal e uma rede de transportes na região. "Além disso, e sem falar no pagamento de portagens, refiro a forma de pagamento que é uma desgraça quando se vem de Espanha para entrar no Algarve pela Via do Infante", considerou Desidério Silva.

Por sua vez, Luís Carmo Costa, CEO da Neoturis, referiu-se a dois tipos de insegurança no Algarve, que podem ser duas ameaças em termos de futuro e que são a segurança rodoviária e a saúde pública. "A história da 125, como diria um inglês, só pode ser uma joke, pois não é estrada que se apresente para quem quer ser um player no turismo mundial. A outra é a questão da segurança na saúde. O ano passado uma pessoa com apendicite teve de ir para Lisboa, de helicóptero, para ser operada porque não havia anestesista no Hospital de Faro. Quem quer ser um destino a sério não pode ter estas inseguranças", alertou Luís Carmo Costa.


Uma escola para o turismo

A Escola Superior de Gestão, Hotelaria e Turismo da Universidade do Algarve tem não só licenciaturas, mestrados, pós-graduações ou cursos curtos, como faz estudos aplicados e investigação e desenvolvimento em turismo.

"Há 30 anos quando começámos a licenciatura em gestão hoteleira eram raras as licenciaturas. Hoje generalizou-se, felizmente, mas não sentimos falta de procura, antes pelo contrário", referiu Hélder Brito Carrasqueira, director da Escola Superior de Gestão, Hotelaria e Turismo da Universidade do Algarve. Mas a oferta estende-se a mestrados em gestão e direcção hoteleira, e em turismo, "e que são frequentados por pessoas que já estão no mercado de trabalho uma vez que as propinas são altas". Tem uma pós-graduação em actividades imobiliárias, faz um curso técnico superior profissional na área de animação turística e depois tem cursos curtos de línguas, finanças para não financeiros, e de Excel avançado com um módulo de análise de dados, a que se vai juntar, no próximo ano, um curso de análise de dados.

Estudos e I&D

A Escola de Gestão, Hotelaria e Turismo também realiza estudos aplicados. Estão a fazer o estudo de avaliação do impacto socioeconómico do empreendimento Quinta da Ombria, em Loulé, de capitais finlandeses. Participaram no plano de marketing para a Região de Turismo do Algarve, no estudo do surf como produto turístico para Aljezur, no levantamento do turismo residencial, que deverá ser actualizado, no estudo do impacto económico do Rallye de Portugal para o ACP.

Na área de Investigação e Desenvolvimento, com uma produtora de software de turismo da região, a Visualforma- Tecnologias de Informação, fizeram um estudo sobre o Smart Revenue Management. Este produto de gestão da receita tem por objectivo vender a maior quantidade de quartos pelo melhor preço possível tendo em conta a perecibilidade do inventário, a concorrência, as variáveis da procura e a complexidade das relações entre os diversos canais de distribuição.

Realiza ainda estudos internacionais com outras universidades como a Ca' Foscari Universidade de Veneza, Universidade de Split, Universidade de Málaga, Geographical Institute da Slovenian Academy. Como o Shape Tourism sobre destinos da bacia do Mediterrâneo, que deu origem a uma ferramenta que está disponível em shapetourism.eu, que tem vários dados e até gráficos interactivos dos concelhos do Algarve com outros destinos turísticos. 

Hotel escola

A escola tem laboratórios onde se procede a esse treino prático e um protocolo com o Hotel Eva para ensino em contexto profissional. No âmbito do plano tecnológico para os politécnicos, "o primeiro projecto que vamos candidatar é a casa do reitor, onde fazemos hoje o nosso laboratório e que queremos transformar num hotel escola interno", revelou Hélder Brito Carrasqueira. Prevê uma cozinha de dimensão industrial, bar, restaurante, recepção, quartos. "É um laboratório de treino para qualificar melhor os recurso humanos e ir de encontro às necessidades da região e dos empresários e valorizar as competências para que elas sejam melhor remuneradas".


O futuro passa pela regeneração

A conciliação de tantos interesses complica uma estratégia comum de longo prazo, que passa por envolver os autarcas, até porque o ordenamento do território precisa de ser repensado.

"O Algarve precisa de ser verdadeiramente regenerado, até porque há todas as condições para conseguir e para ganhar, pois está cá tudo", defendeu Rodrigo Machaz, membro do conselho geral da Associação Portuguesa de Hotéis .

Mas a regeneração do Algarve passa por duas coisas essenciais. "A primeira é saber muito bem o que queremos, que Algarve queremos, e como é que o queremos. E isso implica uma reflexão profunda e espero que no próximo Congresso da Associação haja um painel só sobre o Algarve. O que implica uma partilha entre todos e não as várias quintinhas, tem de ser um produto como um todo, onde têm de caber todos", sugeriu Rodrigo Machaz.

Essa regeneração tem a ver com modernidade, ser actual. "Podemos incluir todas as actividades, mas temos de saber o que queremos, e têm de ser compatíveis com o que a região pretende oferecer como turismo", salientou. Na sua opinião, tem de ser um caminho discutido e partilhado por todos e com uma estratégia de longo prazo. "Como é que podemos regenerar o Algarve? Passa pelo entendimento entre as pessoas. Parece fácil mas é o mais difícil", concluiu Rodrigo Machaz.

"Quando falamos da requalificação da oferta do nosso produto já é um aspecto requerido pelos nossos clientes, e quem conhece o hardware da actividade hoteleira sabe a importância e necessidade destes investimentos. O particular olhar dos stakeholders é bem-vindo e indiscutivelmente necessário que a requalificação se vá fazendo", salienta Bernardo Trindade, presidente do Portugal IN.

Envolver os autarcas

Para Desidério Silva, que concorda com a necessidade de regeneração, numa região em que há um conjunto de actores que têm interesses, é muito difícil conjugar esses vários interesses. Referiu que "ainda não conseguimos chamar para esta discussão os autarcas e os municípios, que são os principais responsáveis pelos territórios e que têm um papel neste processo de requalificação ou de regeneração. Por isso tem de se contar com os autarcas e com a AMAL, até por causa dos transportes". Mas tem de ser feito. Como referiu Bernardo Trindade, "a dinâmica do Algarve não é hoje concelhia, mas é compósita, que envolve um conjunto vasto de dinâmicas empresariais, associativas, e de intervenção pública".

O plano de ordenamento do território, o PROT de 2007, mantém-se e é preciso discuti-lo e adaptá-lo à nova realidade. "Quando se fala em turismo desportivo, em trazer mais pessoas, diversificar este tipo de ofertas, o nosso PROT diz que os 500 metros a partir da linha de água e os 2500 metros só serve para hotéis, não podendo ser feitos centros de estágios, edifícios para geriatria, equipamentos de outra natureza", exemplificou Desidério Silva. Estas limitações são o que Luís Carmo Costa, CEO da Neoturis, chama risco administrativo, que os investidores estrangeiros incorporam nas suas análises de investimento, "pois os grandes projectos tornam-se mais complicados por causa das questões do ordenamento".