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A tecnologia ao serviço da água e do regadio

“A água é vida e sem agricultura também não há vida. Tem de se pensar no investimento da água como se pensa quando se tem de salvar a TAP ou um banco”, defendeu João Bento Inácio, CEO do JBI Group.

05 de Novembro de 2021 às 14:00
O debate entre José Pedro Salema (EDIA), João Bento Inácio (JBI Group) e António Relvas (Casa Relvas).
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"No Alqueva temos tecnologia em todas as fases do ciclo, tanto na parte agrícola como ao nível da rede e da infraestrutura que faz chegar a água às propriedades de forma eficiente, com menos perdas, e garante que, com o mesmo recurso, conseguimos chegar mais longe e fazer mais. Hoje temos na agricultura infraestruturas de distribuição de água que são mais sofisticadas do que no abastecimento público urbano", referiu José Pedro Salema, CEO da EDIA.

Os sistemas de distribuição tradicionais de regadio transportam a água em canais abertos, precisam de ter uma inclinação muito suave, e, como estão a céu aberto, deterioram-se, há infiltrações e evaporação. "Quando, como no Alqueva, colocamos a água num tubo e num sistema pressurizado há muito menos perdas. A água que é entregue aos clientes é num tubo fechado, com um hidrante, um contador, e sistemas de telegestão. Conseguimos programar no nosso sistema quando é que o agricultor pode ou não abrir a água, podemos abrir e fechar remotamente o sistema", explica José Pedro Salema.

Quando se passa da rede de água para o seu papel na planta, a tecnologia mantém-se presente. "A agricultura mudou muito com a tecnologia de ponta, como as sondas, que medem a humidade de 10 a 60 e 70 cm de profundidade, e percebemos, com os parâmetros de cada uma das culturas, quanto tempo de rega temos de fazer", disse João Bento Inácio, CEO do JBI Group. Por sua vez, António Relvas, administrador da Casa Relvas, adianta que desde o campo, onde tudo começa e onde há maior consumo de água, até à adega, tomaram medidas para garantir que somos o mais eficiente possível na utilização da água.

"Há um grande avanço nas tecnologias de hoje, por isso, no campo, quando vamos fazer uma plantação, fazemos a condutividade elétrica dos terrenos, modelos digitais dos terrenos para escolher as melhores orientações e onde há mais poupança de água". Depois, desde a escolha das variedades, dos porta-enxertos mais adaptados ao tipo de terreno, até aos locais onde se colocam as sondas, "em que tiramos os potenciais hídricos de base que é um método que nós utilizamos que nos diz se a planta esta ou não com stress hídrico e que tipo de stress hídrico deve haver para uma boa maturação da fruta", conclui António Relvas.

A água é vida e agricultura

Nesta viagem pela água nos campos agrícolas, uma das chaves é a monitorização muito eficiente dos nutrientes e das regas por causa da lixiviação e dos nitratos que podem contaminar os lençóis freáticos. Como explicou João Bento Inácio, a árvore ao longo do ano tem vários ciclos de desenvolvimento, como o crescimento vegetativo, a floração, o vingamento, o crescimento e a engorda do fruto. Em cada uma dessas fases, é aplicada a nutrição como azoto, o fósforo, nitrato, o potássio e outros nutrientes. "Monitorizamos em profundidade através de sucção da água para ver a nutrição, fazemos análise às folhas, e percebemos em cada uma dessas profundidades, desde a superfície até aos 60 cm, que nutrientes estão no solo para depois fazer as devidas correções."

"Hoje as sondas fazem parte do dia a dia dos agricultores", observou José Pedro Salema. Mas João Bento Inácio balizou que "abrangem cada vez mais agricultores mesmo de menor dimensão mas as empresas agrícolas têm mais capacidade e áreas maiores para controlar".

António Relvas salientou que a localização das sondas também é relevante, o que pode ser feito com ferramentas como as imagens de satélite, os mapeamentos dos solos. "Conseguimos pô-las nos locais certos e nas zonas mais representativas, por exemplo, de uma parcela de 100 hectares e podemos controlá-las pelo telefone". António Relvas salientou a evolução na programação propiciada pela tecnologia. "Conseguimos controlar, tirar relatórios imediatos para a tomada de decisão ser mais precisa. São pequenas coisas que já fazem parte do nosso dia a dia e que mudaram o paradigma da agricultura".

"A água é vida e sem agricultura também não há vida. Tem de se pensar no investimento da água como se pensa quando se tem de salvar a TAP ou um banco", defendeu João Bento Inácio, CEO do JBI Group. "No Algarve tem faltado estratégia para a água. Há riscos até com a água para o consumo, a região não tem barragens com reservas suficientes, estão muito aquém do crescimento que houve na agricultura e no turismo. Entre 2009 e 2019, o turismo mais que duplicou o número de camas e de hotéis."

Reutilização de água

João Bento Inácio admite que "nos últimos dois anos se tem feito um excelente trabalho com o plano de eficiência hídrica mas estamos atrasados. Quando falamos de água achamos que é uma coisa que a chuva resolve, tem de haver estratégias para a água como houve para o Alentejo".

No âmbito do PRR vai haver um investimento num projeto-piloto com reutilização de águas da ETAR de Vila Real de Santo António para pomares de citrinos e de abacates. João Bento Inácio tem dúvidas em relação à "qualidade da água e aos efeitos nos produtos", e considera que a "reutilização de águas deve ser para a lavagem de ruas nas cidades, nos jardins, mas não no regadio", além de que há cotas que obrigam à bombagem da água, o que encarece o seu preço.

José Pedro Salema, CEO da EDIA, diz, baseando-se num projeto com as Águas do Alentejo na ETAR de Beja, que "a qualidade desta água não é assunto, hoje há tecnologia e é água que se pode beber. O problema é a quantidade. Da ETAR de Beja, conseguimos tirar água para regar dez hectares de romãs enquanto no Alqueva se regam 115 mil hectares. Além disso muitas vezes nem interessa que a água para o regadio seja pura porque pode trazer nutrientes, algum azoto". António Relvas revela que a Casa Relvas também reutiliza as águas da ETAR da adega. "É uma água cara por causa da cota e que é utilizada para regar a vinha. A propriedade tem cerca de 60 hectares e esta água dá para regar cinco hectares".

Candidaturas abertas até 7 de novembro "Água: Regadio Sustentável" é o tema do segundo webinar organizado no âmbito do Prémio Nacional da Agricultura, uma iniciativa do Correio da Manhã e do Jornal de Negócios em parceria com o BPI, e que conta com o patrocínio do Ministério da Agricultura e o apoio da PwC. Depois de no primeiro webinar terem sido abordados os temas da digitalização, da inovação e da tecnologia, fundamentais para o futuro do setor, foi a vez da água e do regadio, que se defrontam com fortes desafios num futuro próximo, como as alterações climáticas, a descarbonização, e as crescentes exigências regulatórias.

"O setor da agricultura tem demonstrado nos últimos anos uma capacidade de inovação e de resiliência notáveis, o que comprova o acerto da nossa decisão quando elegemos a agricultura como um setor prioritário há mais de dez anos quando o sucesso do setor agrícola não era evidente", referiu Pedro Barreto, administrador do BPI. "O Prémio Nacional de Agricultura ocupa um lugar de destaque nessa estratégia permitindo enaltecer o melhor que se faz em Portugal nesta área e é com todo o gosto que todos os anos somos surpreendidos com projetos fantásticos que muito nos orgulham", concluiu Pedro Barreto.

As candidaturas à 10.ª edição do Prémio Nacional da Agricultura estão abertas até 7 de novembro de 2021.