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A emergência do “prosumer”, que produz e consome energia

A geração distribuída pura e dura implica produzir de uma forma dispersa e local para consumo local, considera Humberto Jorge.

02 de Novembro de 2022 às 15:00
Painel de debate “Modelos de produção descentralizada”. Ricardo Almeida
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"Geração distribuída é termos muitas centrais, muitas ligações de produção de energia elétrica a partir de fontes renováveis", referiu Sara Veiga de Macedo, diretora adjunta na direção de clientes da E-REDES, durante o debate sobre "Modelos de produção descentralizada", na segunda conferência realizada na Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, numa organização da E-REDES, em parceria com o Negócios, para debater o contributo das redes de distribuição de eletricidade para a transição energética.

Com a geração distribuída configuram-se novos perfis de clientes. "São 10 milhões de pessoas que necessitam dos nossos serviços. Nesses 10 milhões há 6,4 milhões de clientes que estão ligados à nossa rede. Temos 30 mil clientes de empresariais e estão a surgir novos clientes que são produtores, autoconsumidores, tanto consumidores individuais como coletivos, novos clientes relacionados com os postos de carregamento de mobilidade elétrica", afirmou Sara Veiga de Macedo.

Produção e consumo local

Quando Humberto Jorge, diretor do Departamento de engenharia eletrotécnica em informática da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, terminou o seu doutoramento em 1999, "tínhamos uma produção bastante controlável e não era preciso gerir muito bem a carga, e a produção ia atrás da carga com facilidade. Agora as coisas estão a mudar, e vão mudar muito com a transição energética, que será uma revolução".

Sublinhou que se pode falar na emergência do "prosumer", que produz e que consome energia, o que para Humberto Jorge cria "uma variação de carga que vai trazer alguns problemas para a rede, que não está preparada, e penso que não vai estar, nem é essa a função da geração distribuída pura e dura, porque esta implica produzir de uma forma dispersa e local para consumo local". Salientou ainda que as comunidades de energia podem resolver em parte este problema. Para Humberto Jorge, "a rede vai ser pouco bidirecional na parte da baixa e média tensão e nem faz muito sentido investir na bidirecionalidade da rede. É muito importante que a energia produzida localmente seja consumida localmente".

Investigação e empresa

Um exemplo de novos atores na energia é a Cleanwatts, que nasceu "de um de esforço de mais de uma década a olhar para estes temas das comunidades de energia mesmo em alturas em que se chamavam green neighbors", como explicou Luísa Matos, cofundadora e diretora de inovação e produto na Cleanwatts.

"Não foi uma ideia repentina, participámos em mais de 65 projetos da investigação", disse Luísa Matos. Começaram com os temas mais tecnológicos, a que se se acrescentaram investigações sobre a valorização das transações, a viabilidade económico-financeira, o consumo engagement e a criação de valor social dentro das comunidades.

A Cleanwatts está Portugal, Itália, Estados Unidos, Brasil, estão a entrar em Espanha, e tem um distribuidor no Japão. "Há uma diversificação na abordagem no mercado e estamos a dar prioridade aos mercados onde há ambiente regulatório favorável às comunidades de energia, que podem ter vários formatos. Pode não ser a comunidade de energia renovável, mas ver as coisas do ponto de vista mais holístico daquilo que é a produção e consumo e partilha dentro de uma mesma de uma mesma localidade", concluiu Luísa Matos.

Padrões de consumo

Luís Miguel Cruz, professor associado com agregação na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, aborda nas suas pesquisas as interações entre a economia e o ambiente sobretudo numa análise da sustentabilidade e, sobretudo, sobre a existência ou não de trade-offs entre a economia, o ambiente e a sociedade, de um ponto de vista macroeconómico e de apoio à decisão pública e não propriamente sobre ponto de vista de modelos de negócio. Uma das suas conclusões "é que não tem necessariamente de haver trade-offs entre a economia e o ambiente, é possível haver situações win-win, naturalmente com base boas decisões".

Referiu o fenómeno das deslocações, o communting, através de um trabalho de investigação em que participou. Foi feito antes da pandemia e tinha a hipótese de na Grande Lisboa e Margem Sul as pessoas passarem a trabalhar nos locais de residência. Conclui-se que, com o teletrabalho, há alterações diretas no consumo de combustíveis fósseis, "mas há muito mais coisas a mexer na economia e na sociedade, porque se dá uma alteração estrutural dos padrões de consumo, incluindo da eletricidade, e, sobretudo, muda o sítio onde se faz a despesa".

Os números do novo mundo da energia

Nas centrais de ligação de produtores de eólicas e solares em 2020 e 2021 eram ligadas anualmente 10 centrais. "Em 2022, já temos cinco vezes mais centrais ligadas que têm 1 MW ou acima", garante Sara Veiga de Macedo. As unidades de pequena produção, entre 2020 e 2021 para 2022, multiplicaram-se por cinco e preveem que já se poderá multiplicar por 10 em relação a 2022. Em termos de unidades pequenas de produção receberam este ano mais de 1.400 pedidos de ligações de pequenas de unidades, até 1 MW.

"Quando falamos de uma outra área do autoconsumo, individual e coletivo, temos 100 mil clientes de autoconsumidores. Quando comparamos 2021 com 2019 multiplicamos por cinco, e prevemos que no triénio 2023-2025 o número de ligações será de cem mil ao ano", considera Sara Veiga de Macedo. Em termos de mobilidade em 2022 já integraram na rede mil postos de carregamento de veículos elétricos, e as previsões para o próximo triénio são a sua triplicação. Os contadores inteligentes são a peça fundamental para se ter todas as informações, os dados e as operações remotas e a E-REDESjá fez deployment de 71% destes equipamentos.