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O papel dos privados no PRR da habitação

Entre verbas do PRR, do IFRRU e do PT 2030, estimam-se mais de 4 mil milhões de euros para programas na área da habitação e imobiliário num período muito curto (2022-2027), e cheio de incertezas com a inflação, a falta de mão de obra, e a disrupção das cadeias de abastecimento.

Filipe S. Fernandes 25 de Novembro de 2021 às 14:00
Gonçalo Moura Martins (Mota-Engil), Abel Mascarenhas (IFRRU 2020) e João Nuno Palma (Millennium bcp) foram os protagonistas do debate. Miguel Baltazar
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No PRR, as verbas para a habitação ultrapassam os 2.700 milhões de euros, a que se somam as verbas do IFRRU 2020, que são 1.400 milhões de euros, e as futuras verbas do PT 2030, ou seja, "podemos estar a falar em verbas superiores a 4 mil milhões de euros para a habitação e imobiliário", disse Abel Mascarenhas, presidente da comissão executiva do IFRRU 2020. Acrescentou que Portugal, segundo o INE, tem cerca de um milhão de edifícios que carecem de reabilitação, dos quais 400 mil estão em piores condições. "Há aqui uma enorme oportunidade para reabilitar e pôr estes imóveis em arrendamento acessível, para conseguirmos passar de um parque público de habitação de 2% para 5%, que é a meta."

"A habitação é uma prioridade nacional, é uma questão estratégica para o país, e o Millennium bcp é um agente que vem facilitar, financiar este desafio e esta prioridade nacional", disse João Nuno Palma, vice-presidente da comissão executiva do Millennium bcp. Mas não deixou de alertar que "o PRR é um programa curto, vai até 2026. Temos de trabalhar bem, é preciso a capacidade de execução, e depois temos desafios adicionais, como os preços das matérias-primas, a disrupção das cadeias de valor, o que está a introduzir turbulência, mas não se vão alterar as datas, é 2026".

Gonçalo Moura Martins, CEO da Mota-Engil, adiciona ainda como fatores de incerteza estruturais a inflação e a mão de obra. Diz que neste caso, implica "políticas públicas de mão de obra para viver e criar raízes no país".

O financiamento do banco ao promotor e às empresas de construção já atingiu em 2021 cerca de 400 milhões de euros. No crédito à habitação, estão a financiar cerca de 200 milhões de euros por mês, "o que dá uma noção da dinâmica que existe hoje em dia no mercado", explica João Nuno Palma.

O "boom" da reabilitação

O IFRRU é um parceiro estratégico do Millennium bcp e têm uma linha de cerca de 300 milhões de euros que se repartem entre 130 e 140 milhões de euros do IFRRU, 170 milhões do Millennium bcp, para financiar a reabilitação. Abel Mascarenhas explicou que o IFRRU 2020 é um programa para a reabilitação de edifícios e que em setembro de 2021 assinou 340 contratos com um investimento de 1020 milhões de euros. "É um valor recorde histórico para um instrumento financeiro de reabilitação urbana dentro de um quadro comunitário, atingido assim mais de mil milhões de euros.

Estes programas de reabilitação urbana existem porque estão todos ligados ao European Green Deal, o plano de crescimento da Comissão Europeia que tem como objetivo que a Europa seja o primeiro continente a atingir a neutralidade carbónica em 2050, explicou Abel Mascarenhas. Tem dois objetivos: criar empregos enquanto se reduzem emissões. "Os edifícios representam 40% do consumo energético e em termos de gases de efeito de estufa representam 36%. Se queremos atingir estes objetivos em 2050, temos mesmo de ter aqui uma intervenção na parte da reabilitação urbana."

Segundo um estudo do Banco Europeu de Investimento, este programa IFRRU 2020 vai criar cerca de 14 mil empregos entre diretos e indiretos e, em termos de eficiência energética, a redução do consumo equivale a um ano de operação de oito grandes hospitais públicos. Em termos de redução de gases de efeito estufa atingiu as 24 mil toneladas por CO2, o que equivale a tirar das estradas 20 mil viaturas. "Criamos empregos, renovamos habitações e reduzimos as emissões", conclui Abel Mascarenhas.

Novo ciclo de investimento

João Nuno Palma referiu-se ainda à habitação para a função turística, "pois não podemos esquecer que Portugal é top 12 de turismo mundial e é o líder mundial de infraestruturas de apoio ao turismo, fruto de um investimento massivo que foi feito com o apoio da banca e com a visão dos empresários dos promotores e o alinhamento de políticas públicas".

João Nuno Palma referiu o papel do banco nos principais eixos do PRR para a habitação. Por um lado, vão financiar as empresas privadas que vençam os concursos lançados pelo Estado para a habitação social através de desconto das faturas sobre o Estado. No caso do arrendamento acessível, disse que "existe a reabilitação dos espaços públicos, mas também pode haver financiamento a espaços privados, ativos, que entrem no mercado de renda acessível com contratos de 15 anos com o Estado, o que permite descontar o contrato de arrendamento. É um modelo híbrido muito interessante e vai permitir ter mais oferta e colmatar este défice de habitação que estamos a ter relativamente aos jovens e à classe média, para ter acesso a casas de renda de renda acessível".

Este novo ciclo de investimento vai fazer com que em 2021, onze depois, Portugal volte a ser o principal mercado da Mota-Engil, que chegou a ter 80% da sua atividade noutros países. "É um sinal não só importante para as empresas que fazem aqui a sua base, mas também porque significa que a economia está dinâmica, está a crescer", diz Gonçalo Moura Martins.

Muito antes de haver estes investimentos públicos com algum significado, na ferrovia maioritariamente, sentia-se um crescimento muito grande na área da habitação e da reabilitação urbana, com a construção, por exemplo, de hotéis. "Havia um dinamismo do setor privado tanto na promoção imobiliária como também nas infraestruturas de turismo que foi muito importante para a construção", acentuou Gonçalo Mota Martins. Salientou que o mercado da habitação em Portugal cresceu, abriu-se e hoje há um segmento premium de luxo como havia em todas as grandes capitais europeias.