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A odisseia dos recursos humanos, falta de autonomia e orçamentos curtos

A pandemia mostrou que é necessário um sistema de saúde, não só o SNS, mais forte e mais robusto, e agora há capacidade de o pensar de forma diferente e a possibilidade de o redesenhar para que nos próximos anos responda da forma desejada, defende Fernando Araújo.

28 de Outubro de 2021 às 18:00
O debate entre Fernando Araújo, Rui Diniz e Victor Herdeiro.
O debate entre Fernando Araújo, Rui Diniz e Victor Herdeiro. Marilime Alves
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"A gestão dos recursos humanos é a área mais preocupante da saúde e a limitação da capacidade que temos para estimular a progressão, a diferenciação e o reconhecimento das boas práticas no SNS é muito difícil", salientou Fernando Araújo, presidente do Centro Hospitalar de São João, que tem um orçamento anual da ordem dos 400 milhões de euros.

Segundo Fernando Araújo há "uma grande formatação dos recursos humanos, que começa logo pela sua captação que está muito dependente de decisões centrais, e depois está de alguma forma vedada a capacidade de podermos premiar o trabalho, o esforço que é feito, o que limita a possibilidade de tirar o máximo benefício destes profissionais altamente especializados". "Os administradores têm de ter capacidade de gerir os seus recursos no dia a dia e de gerir os hospitais para tornar mais eficazes os cuidados dos doentes".

Orçamento abaixo 20%

Mas no catálogo de lições e problemas no pós-covid-19 de Fernando Araújo consta o planeamento e organização, que "faltou durante a pandemia e que agora era necessária uma estratégia, uma ideia, uma visão do que se pretende para o SNS e para o sistema de saúde porque, sem essa estratégia bem definida, corremos o risco de as instituições terem o seu plano que pode não ser a mais adequado para funcionar numa rede clara e transparente".

No lado hospitalar referiu uma questão fundamental que é a autonomia. "Não é possível voltar ao centralismo nas decisões, que não poupa dinheiro ao Estado nem defende o interesse dos utentes nem dos profissionais", sublinhou Fernando Araújo. Acrescentou que em vez da autonomia com responsabilidade e escrutínio, se regressa ao paradigma de "desconfiança total dos gestores e a forma como gerem, o que leva a uma desresponsabilização".

Fernando Araújo falou ainda da orçamentação anual. Disse que o orçamento para 2022 do Hospital de São João foi aceite pelo Ministério das Finanças "com um conjunto de despesas consideradas relevantes e reais, vai ser aprovado um orçamento de financiamento 20% abaixo do que sabem que o hospital vai gastar. O que significa um défice operacional durante o ano e, algures no tempo, farão dotações extraordinárias com muito pouca transparência".

Sistema de saúde

"Tem havido um esforço enorme de investimento na saúde mas, sem um plano concreto e sem uma organização diferente, estamos a meter mais dinheiro no sistema que não está organizado para aquele fim. Temos ganhos marginais do ponto de vista de saúde mas com cada vez menos eficiência face aos euros que colocamos. A despesa apresenta uma dinâmica muito elevada e depois os resultados mostram-se frustrantes, é muito pouco para o que se põe no sistema", considerou Fernando Araújo.

Na sua opinião, "a pandemia mostrou que precisamos de um sistema de saúde, não só o SNS, mais forte e mais robusto, e temos agora capacidade de o pensar de forma diferente e a possibilidade de o redesenhar para que nos próximos anos responda da forma que nós queremos".

Os recursos são escassos, por isso, a articulação de esforços e meios é positiva. Rui Diniz, Presidente da comissão executiva da CUF
Rui Diniz, presidente da comissão executiva da CUF, concordou e afirmou que "na segunda fase da pandemia houve uma articulação claramente positiva entre hospitais privados, públicos e o setor social, seja em termos mais locais como o nosso Hospital CUF Porto com o Hospital de São João, seja em termos mais centrais com as ARS, com o nosso hospital CUF Tejo com a ARS de Lisboa de Vale do Tejo".

Os recursos são escassos, por isso a articulação de esforços e meios é positiva, o que, segundo Rui Diniz, "exige fluidez de informação para que todos saibamos o que está a ser feito em cada momento mas também exige abertura para que essa cooperação exista. Mas muitas vezes não existe essa abertura e só quando a necessidade é muito real é que essa abertura acaba por se concretizar".