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O impacto da pandemia de covid-19 nas doenças hematológicas terá sido, segundo Fernando Leal da Costa, a existência de mortalidade associada à covid-19 em doentes com comorbilidades oncológicas. "Houve surtos em internamentos com a consequente necessidade de isolar doentes, encerrar camas e colocar pessoal de quarentena. Houve pessoal infetado, como se esperaria. Logo, também houve quebra da capacidade de resposta assistencial em internamento, mas a capacidade de manter consultas, pelo menos no IPO de Lisboa, não se alterou".
Outro impacto significativo para Fernando Leal da Costa foi a "grande e porventura desnecessária quebra de resposta nos cuidados primários, com a consequente diminuição de capacidade de diagnosticar e encaminhar precocemente". Refere ainda que no IPO de Lisboa receberam "pacientes mais gravemente doentes, com doença mais avançada, mas não temos quantificação que permita afirmar com certeza se a covid-19 implicou um aumento estatisticamente significativo de doentes mais graves a chegarem a este IPO".
Os doentes hemato-oncológicos que tinham sido diagnosticados antes do início da pandemia conseguiram um acompanhamento hospitalar regular, tendo tido acesso à terapêutica, a consultas presenciais ou teleconsultas.
O problema da fase aguda
Os pacientes com doença em fase aguda continuaram a ser diagnosticados ao longo do período da pandemia já que os sintomas são difíceis de ignorar, preocupam-nos agora os diagnósticos de doentes com doença em fase crónica", revela Lara Cunha, diretora executiva da APCL (Associação Portuguesa Contra a Leucemia). No caso destes doentes houve dificuldades no "acesso aos cuidados de saúde primários".
Mas na opinião de Lara Cunha o maior impacto da pandemia tem sido ao nível emocional, social e financeiro. "A APCL tem percebido um aumento do número de doentes que procura apoio psicológico e também um aumento do número de doentes que recorrem ao programa de apoio social através das assistentes sociais dos hospitais onde são acompanhados", disse Lara Cunha.
Para José Mário Mariz, diretor da clínica de Hemato-Oncologia do IPO do Porto, é difícil ter a certeza do verdadeiro impacto da pandemia, mas na sua opinião não terá sido muito significativo olhando para o número de novos doentes no período. "O número de primeiras consultas diminuiu cerca de 3%, o que não me parece muito significativo, uma vez que algumas das primeiras consultas foram adiadas simplesmente porque o quadro clínico o permitia, eram doenças crónicas que não necessitavam de qualquer intervenção clínica naquele momento e por isso foram adiadas", disse José Mário Mariz. A mesma opinião em relação a um eventual agravamento dos quadros clínicos. "Não consigo ter a certeza de que tenha sido afetada de forma significativa com a pandemia. Sempre tivemos situações de quadros clínicos avançados mesmo antes da pandemia."
O valor da vacinação
Fernando Leal da Costa salientou que o IPO de Lisboa nunca deixou de receber doentes, e se neste caso não se põe a questão de haver a recuperação da atividade assistencial, tem outro tipo de constrangimentos, vindos do passado, no acesso a meios complementares de diagnóstico com imagem.
Na área de hematologia do IPO do Porto não existe nenhum plano específico, para recuperação da atividade "porque estivemos sempre presentes e demos sempre a resposta necessária durante a pandemia", afirma José Mário Mariz.
Em relação à vacinação, considera ser muito positivo para os doentes com doenças hematológicas porque lhes confere uma proteção adicional. "Muitos dos doentes hematológicos, fruto da própria doença ou dos tratamentos realizados ou em curso, respondem muito mal à vacinação, pelo que mesmo que sejam vacinados correm risco de não adquirirem proteção. Estes doentes beneficiam muito mais da vacinação dos potenciais contactos que felizmente aconteceu ou está a acontecer em Portugal", concluiu José Mário Mariz.