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"A incerteza que se avizinha ainda é profunda", alerta a presidente do BCE
A presidente do BCE considera que a instituição conseguiu com que se mantenha a expectativa de que a inflação regresse aos 2% no segundo semestre do próximo ano, mas avisa que a incerteza sobre a economia e consequentemente da política monetária pode ser profunda. Olhando para o combate dos bancos centrais, Lagarde fez o "mea culpa" e reconheceu que "subestimou" o valor da comunicação do BCE.
A presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde, alertou esta sexta-feira que os tempos de que se avizinham são de "incerteza profunda", incluindo na transmissão da política monetária e apelou a um novo conceito de "estabilidade" que se abstenha de rigidez, e portanto acompanhada de flexibilidade para a hora em que os bancos centrais têm que agir.
"A nossa política determinada conseguiu manter as expectativas sobre a inflação e prevê-se que a inflação regresse [à meta dos] 2% no segundo semestre do próximo ano. Tendo em conta a dimensão do choque inflacionista, esta correção é notável", começou por dizer Lagarde, durante o seu discurso no âmbito de um evento organizado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), em Washington.
Ainda assim, "a incerteza que se avizinha ainda é profunda", alertou, acrescentando que "a economia está a passar por mudanças transformadoras, sendo necessário analisar e compreender o seu impacto", acrescentou a presidente do BCE. Entre estas mudanças estão "as alterações climáticas e o envelhecimento das sociedades", algo novo na História, assim como o progresso tecnológico, uma das mudanças, que na ótica de Lagarde "se assemelham às que aconteceram há um século".
E esta incerteza já se transportou para a política monetária. "A eficácia da política monetária está intrinsecamente ligada à evolução da economia" e "nos últimos anos, a incerteza quanto à transmissão da política económica tem sido particularmente acentuada", salientou a francesa.
E o que pode dizer o passado sobre como podem os bancos centrais reagir a estas mudanças? "A principal lição para os bancos centrais foi que o paradigma dominante não era robusto em tempos de profundas mudanças estruturais", sublinhou Lagarde, tendo recordado que foi "esta constatação que levou ao aparecimento, algumas décadas mais tarde, de estratégias modernas de política monetária, centradas na estabilidade dos preços e em estratégias de flexibilidade" da política monetária.
"Substimei o valor da comunicação dos bancos centrais"
Após o discurso, Lagarde sentou-se em palco com a sua sucessora no FMI, a diretora-geral Kristalina Georgieva, diante de quem reconheceu que foram cometidos alguns "erros" durante a última escalada inflacionista, após a pandemia, e fez o seu "mea culpa", acrescentando que é preciso "humildade e habilidade" para contornar estes erros.
Para cumprir a sua missão, as autoridades monetárias devem, na ótica de Lagarde, ter como claros "o mandato, os objetivos e a comunicação", e quanto a este último ponto a presidente do BCE reconhece que nem sempre esteve no topo da sua agenda.
"Eu tinha subestimado o valor da comunicação dos bancos centrais, é um exercício muito específico mas tem claramente um impacto no público em geral, mas também nos observadores financeiros e no operadores de mercado que transmitem a política monetária", frisou Lagarde.
A líder do BCE reconheceu ainda que "os responsáveis pela política monetária na altura, assumiram [os preços da] energia como um momento transitório, o que resultou em erros mais profundos". No entanto, Lagarde acredita que estes erros foram corrigidos, até porque o "importante é ter a a habilidade e humildade de dizer ‘isto está errado’ e examinar as ferramentas de que dispomos".
A ex-diretora-geral do FMI foi ainda questionada por Kristalina Georgieva sobre a importância do euro digital, na nova era de digitalização. Lagarde acabou por responder com um punhado de razões para justificar o processo de projeção, investigação e potencial lançamento desta nova forma de dinheiro na Zona Euro.
Entre as razões destaca-se a necessidade de a autoridade monetária estar ombro a ombro com a banca, enquanto emissor de moeda fiduciária. "Temos o dinheiro [da banca] comercial e o dinheiro do banco central e os bancos comerciais usam o digital, utilizam o DLT [tecnologias de registo distribuído] e nós [enquanto banco central] corremos o risco de o dinheiro do banco central" acabar por ser desvalorizado face à moeda comercial, justificou Lagarde.
"Em segundo lugar, esta é também uma altura em que os bancos centrais estão a preparar moedas digitais com implicações transfronteiriças", assim não se trata apenas de "perder o dinheiro do banco central, mas também perder o controlo do dinheiro soberano", acrescentou Lagarde.
(Notícia atualizada às 17:49 horas).