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Três ONG suspendem operações no Afeganistão
A ordem a proibir as mulheres nas ONG foi divulgada numa circular do ministro da Economia, Qari Din Mohammed Hanif.
Três agências de ajuda estrangeiras suspenderam este domingo, 25 de dezembro, as operações no Afeganistão na sequência da decisão do governo dos talibãs de proibir as mulheres de trabalharem em organizações não-governamentais (ONG) internacionais e locais.
Trata-se da Save the Children (com sede em Londres), do Conselho Norueguês para os Refugiados (Oslo) e da CARE (Genebra), segundo a agência norte-americana AP.
As três ONG justificaram que não podem chegar eficazmente às pessoas no Afeganistão que necessitam desesperadamente de ajuda sem as mulheres nas suas estruturas locais.
A proibição foi imposta no sábado, alegadamente porque as mulheres não estavam a usar corretamente o véu islâmico.
"Cumprimos todas as normas culturais e simplesmente não podemos trabalhar sem o nosso dedicado pessoal feminino, que é essencial para termos acesso às mulheres que necessitam desesperadamente de assistência", disse o chefe do Conselho Norueguês para Refugiados no Afeganistão, Neil Turner, à AP.
Turner disse que a ONG norueguesa tem 468 mulheres no Afeganistão.
A decisão sobre as ONG do governo talibã segue-se à proibição de as mulheres frequentarem o ensino superior.
Os talibãs retomaram o poder em agosto de 2021, após a retirada de uma força internacional liderada pelos Estados Unidos que esteve no Afeganistão durante 20 anos.
A intervenção internacional seguiu-se aos atentados da Al-Qaida contra os Estados Unidos, em 11 de novembro de 2001, e teve como justificação o abrigo dado ao líder do grupo terrorista, Osama bin-Laden, pelo regime talibã, que foi deposto na altura.
Os talibãs, cujo regime se caracteriza por uma interpretação rigorosa das leis islâmicas, reorganizaram-se e mantiveram uma luta contra o governo pró-ocidental de Cabul, que colapsou com o avanço das forças rebeldes e a retirada das tropas estrangeiras.
Desde então, milhões de afegãos foram arrastados para a pobreza e a fome por uma economia frágil e por medidas que impediram o acesso do Afeganistão às instituições globais e ao dinheiro externo de que o país estava dependente antes da retirada das forças internacionais.
Em novembro, numa entrevista à AP, um alto funcionário do Comité Internacional da Cruz Vermelha, Martin Schuepp, disse que mais afegãos irão lutar pela sobrevivência à medida que as condições de vida se deteriorarem no próximo ano e o país se preparar para o segundo inverno sob o domínio talibã.
A ordem a proibir as mulheres nas ONG foi divulgada numa circular do ministro da Economia, Qari Din Mohammed Hanif.
Nos termos da decisão, qualquer ONG que não cumprir a ordem terá a sua licença revogada no Afeganistão.
O porta-voz do Ministério da Economia, Abdul Rahman Habib, recusou-se hoje a comentar a decisão e a dar pormenores sobre a proibição, segundo a AP.
Os Estados Unidos avisaram que a proibição de as mulheres trabalharem nas ONG irá perturbar a assistência vital a milhões de pessoas.
"As mulheres são centrais para as operações humanitárias em todo o mundo", disse o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, no sábado.
"Esta decisão pode ser devastadora para o povo afegão", acrescentou o chefe da diplomacia dos Estados Unidos.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, disse ter ficado profundamente perturbado com a decisão.
"As Nações Unidas e os seus parceiros, incluindo organizações não-governamentais nacionais e internacionais, estão a ajudar mais de 28 milhões de afegãos que dependem da ajuda humanitária para sobreviver", disse o antigo primeiro-ministro português num comunicado.
No seu primeiro governo (1996-2001), os talibãs baniram as mulheres da educação e dos espaços públicos e proibiram a música, a televisão e muitos desportos.