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Portugal tem "desafios acrescidos" no report ESG

Madalena Cascais Tomé, CEO do grupo SIBS, afirma que a integração Environmental, Social and Governance diminui riscos, responde às exigências regulamentares e melhora os negócios. Mas há caminho a fazer e essa opinião é partilhada por vários dos participantes na conferência de apresentação da plataforma SIBS ESG.

11 de Junho de 2024 às 13:08
Os debates na conferência de apresentação da plataforma SIBS ESG tiveram diferentes painéis e contaram com vários oradores e peritos dos setores da banca, turismo e retalho.
Os debates na conferência de apresentação da plataforma SIBS ESG tiveram diferentes painéis e contaram com vários oradores e peritos dos setores da banca, turismo e retalho.
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"Mais do que transição ESG é transformação ESG" – é essa a expetativa de Madalena Cascais Tomé, CEO do grupo SIBS, sobre a nova plataforma SIBS ESG, que pretende ajudar as empresas a reportar os seus desempenhos em matéria de sustentabilidade, ao abrigo da nova regulamentação europeia.




Durante a sessão de abertura da conferência de apresentação da nova plataforma, a CEO do grupo SIBS defendeu que a integração ESG (Environmental, Social and Governance) permite "mitigar riscos, responder a exigências regulamentares e abrir portas à inovação". No entanto, admite que "Portugal tem desafios acrescidos", sobretudo por o tecido empresarial ser maioritariamente constituído por pequenas e médias empresas (PME). "O peso das PME, em Portugal, é superior ao da média europeia, além de serem de menor dimensão." Mais: está "concentrado em setores como o comércio e a indústria transformadora enquanto na Europa são de tecnologia e serviços mais avançados". As características do país, afirma Madalena Cascais Tomé, representam outro "desafio ambicioso". "Portugal é mais vulnerável pelas suas condições climáticas, como as ondas de calor, incêndios, secas", assim como pela "grande representatividade económica nas zonas costeiras". E justifica: "Muita da economia portuguesa assenta em setores que dependem do clima como a agricultura, a pesca e o turismo."

 

A plataforma SIBS ESG, apresentada por Pedro Miranda, diretor-geral da SIBS Processos, "é totalmente gratuita para as empresas". Numa primeira fase, funcionou por convite e, a partir de agora, as empresas já podem fazer o autorregisto "mesmo que não tenham crédito bancário".

 

Segundo Madalena Cascais Tomé, "o SIBS ESG vai permitir às PME a gestão da sustentabilidade de forma mais eficiente e o acesso a informação de forma mais atempada às instituições financeiras". Por se tratar de um "projeto colaborativo", que inclui banca, instituições e organismos públicos – como o IAPMEI e o Turismo de Portugal –, associações e universidades, vai "evitar um esforço adicional por parte das empresas" de terem de fornecer a mesma informação a entidades diferentes.


"Temos uma pistola apontada à cabeça"

Clara Raposo, vice-governadora do Banco de Portugal (BdP), considera que "a emergência climática é uma realidade", mas "muitas vezes os bancos e as empresas encaram com alguma perplexidade quando se fala no risco climático porque não parece tão financeiro nem imediato quanto isso". No entanto, assegura que não devemos ignorar estes riscos. Para a vice-governadora do BdP, "é na economia real que está a transformação que é necessária", mas o setor financeiro "tem de acompanhar". Apesar de serem os bancos centrais que estão a exigir que os bancos reportem nesta matéria de sustentabilidade, Clara Raposo informa que os primeiros não estão ao leme no combate às alterações climáticas. "Não estamos ao leme, mas estamos todos no mesmo barco. Os intermediários financeiros e os bancos são também as pontes para o futuro – pontes que as empresas atravessarão. Cabe aos bancos centrais lançar âncoras firmes."

 

No que diz respeito ao papel do sistema financeiro na transição ESG, a vice-governadora do BdP avisa que "os bancos têm de conhecer bem as empresas que estão a financiar". Quanto à forma como é feita essa análise, deixa um alerta: "Tem de ser coerente, não podemos ter um banco que faz uma análise de uma empresa e outro que faz uma análise completamente diferente." Recados que não passaram despercebidos aos responsáveis da banca presentes na conferência de apresentação da plataforma SIBS ESG.

 

Para João Oliveira e Costa, CEO do banco BPI, "mais uma vez a banca vai prestar um serviço público importante, mas não é reconhecida por isso": "Quando foram as moratórias e a pandemia, ninguém valorizou a banca. Quando vemos a quantidade de pessoas que têm casa, ninguém fala na banca. O que sentimos é que temos uma pistola apontada à cabeça e temos de dizer sim ou sim." No painel de debate "A importância do setor financeiro como motor de transformação ESG", moderado por Margarida Couto, sócia da Vieira de Almeida Sociedade de Advogados (VdA), o CEO do banco BPI valorizou a capacidade agregadora do projeto da SIBS: "Fomos pioneiros em termos conseguido reunir-nos todos à volta da SIBS.

"O SIBS ESG vai permitir às PME a gestão da sustentabilidade de forma mais eficiente e o acesso a informação de forma mais atempada às instituições financeiras." Madalena Cascais Tomé, CEO do Grupo SIBS 

"A banca vai ser empurrada para não financiar"

Outra das questões levantadas durante a conferência de apresentação da plataforma SIBS ESG foi o facto de a falta de informação sobre sustentabilidade poder influenciar a concessão de crédito às empresas. Questionado se esta já será uma realidade, José Miguel Pessanha, vogal do conselho de administração do Millenium BCP, é perentório: "Já estamos nesse ponto. Uma informação mal compreendida, mal transmitida, é suscetível de prejudicar o nosso pricing e podemos praticar um preço que não é devido." Por isso, adverte: "É extremamente relevante as empresas prestarem informação já."

 

Apesar de as PME não estarem, para já, obrigadas a fazer o reporte de sustentabilidade, os vários responsáveis da banca são unânimes em afirmar que as pequenas empresas também vão ter de o fazer devido à pressão do mercado. Para Luísa Soares, chief legal compliance e sustainability officer do Novo Banco, "as empresas pequenas não são obrigadas a reportar, mas vão ter de se habituar porque fazem parte da cadeia de valor. Vai ser sempre exigido a uma certa altura – se não for o banco vai ser o cliente." Na sua opinião, terá de existir "um questionário user-friendly, na medida do possível da taxonomia" e, neste contexto, destaca "uma das grandes vantagens" da plataforma SIBS ESG, que passa por "as empresas terem de reportar só uma vez, mas também haver alguma explicação dos temas".

 

Já Licínio Pina, CEO do Crédito Agrícola, assegura que "falta uma grande literacia sobre critérios ESG por parte das pequenas empresas" e que a capacidade de conseguirem fazer o reporte vai depender "da complexidade do questionário": "Se quisermos fazer um idêntico para grandes e pequenas empresas vai haver diferença de conhecimento." Por isso, é fundamental dar "formação primeiro aos funcionários para que eles próprios percebam o questionário e só depois às empresas", tal como o Crédito Agrícola está a fazer.

 

Questionado sobre as exigências para as grandes empresas, Miguel Belo Carvalho, executive board member do Banco Santander, acredita que "nas grandes empresas os bancos têm o trabalho mais facilitado, mas não significa que tenham menos trabalho". Ainda assim, assegura que "mesmo nas grandes empresas há assimetrias nas formas de comportamento e de mindset", por isso, o Santander tem, muitas vezes, a "necessidade de interpelar muitas das empresas para ter um assessment minimamente razoável".

 

Pedro Leitão, CEO do Banco Montepio, concorda que "a recolha dessa informação há de vir de forma mais facilitada das empresas maiores", no entanto, as PME terão de acompanhar a tendência, sob pena de serem prejudicadas: "Quem não vai fazer a estrada vai ficar para trás", até porque "a banca, quer queira quer não, vai ser empurrada para não financiar".

 

Já Miguel Namorado Rosa, diretor-geral da Direção de Suporte Corporativo da CGD, salienta que todos os processos de transformação têm o "risco de envolver injustiças e processos de exclusão" e que cabe à CGD "transmitir aos clientes a oportunidade que existe ao nível do negócio".

 


Sustentabilidade tem de ser sinónimo de oportunidade

Apesar de estar sempre a crescer, o setor do turismo "tem uma diversidade muito grande" e está "muito exposto a alterações climáticas". O que, segundo Catarina Paiva, administradora do Turismo de Portugal (TdP), traz "muitos desafios de sustentabilidade". O TdP "está a sensibilizar as empresas para fazer um report que não seja meramente financeiro", no entanto, Catarina Paiva admite que ainda não estão "num ciclo avançado".

 

No painel de debate "As empresas no epicentro da transformação ESG", Gonçalo Lobo Xavier, diretor-geral da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED), quis dar "um banho de realidade". "Quando perguntam a um consumidor se prefere um produto sustentável, diz ‘claro que sim’, mas, no final do dia, ao gerir o orçamento, escolhe o produto mais barato." No que diz respeito às empresas, considera que é fundamental que "percebam que a sustentabilidade tem de ser sinónimo de rentabilidade": "Ser sustentável por usar energias renováveis, por trocar as lâmpadas por LED, também vai diminuir a conta da eletricidade e tem reflexo no balanço."

 

Também Ricardo Silva, board & chief sustainability officer da Skypro, empresa portuguesa que fornece vestuário e calçado para tripulações de companhias aéreas, assegura que "só existe sustentabilidade se existir profit" e dá como exemplo a própria empresa: "A nova área de negócio que está a ser criada, em dois ou três anos, vai representar 15 a 20% do volume de negócios."

"A plataforma SIBS ESG é totalmente gratuita para as empresas." Pedro Miranda, diretor-geral da SIBS Processos


Cenário "está a contaminar o negócio das PME"

Na véspera de ser lançada a plataforma SIBS ESG, Rodrigo Tavares, professor catedrático convidado da Nova SBE, fez uma experiência, que descreveu na sua intervenção: "Ontem, em Portugal, lançámos o plano das migrações. Ao longo do dia, comparei o número de pesquisas no Google sobre plano de migrações e ESG: houve mais pessoas a googlar ESG." Na sua apresentação intitulada "A relevância da sustentabilidade para as PME", Rodrigo Tavares refutou as cinco críticas mais frequentes feitas à sustentabilidade financeira, que estão "a contaminar o negócio das PME".

 

Na primeira, "os mais céticos referem que o número de empresas que integra bem estas práticas é muito baixo". "Isso não é necessariamente verdade", assegura o professor catedrático, citando alguns números: "80% das empresas a nível global já ‘casam’ de alguma forma os dados financeiros com sustentabilidade."

 

A segunda crítica advoga que gerar valor financeiro e sustentabilidade "são incompatíveis". Porém, "60% dos estudos académicos conseguem demonstrar que a correlação entre as duas variáveis é positiva".

 

A terceira crítica aponta que "as empresas não estão bem preparadas para adotar práticas de sustentabilidade". E, neste ponto, Rodrigo Tavares admite que não tem "argumentos para contradizer", até porque "91% das empresas em Portugal autodeclaram que não têm os recursos humanos necessários para fazer um bom trabalho na área da sustentabilidade".

 

A quarta crítica refere que "o envolvimento dos bancos na área da sustentabilidade é marginal e centrado em relações públicas". O que Rodrigo Tavares assegura que "não é verdade" e dá como exemplo o cálculo do Green Asset Ratio (GAR): "Calcular o GAR é matematicamente complexo. Tenho perguntado aos bancos quanto tempo demorou a calcular: nunca ouvi menos de um ano e já ouvi alguns dizerem sete ou oito anos."

 

A quinta crítica diz que "a sustentabilidade é só para as grandes empresas", o que também "deixou de ser verdade": "Se a empresa for uma startup, os investidores vão perguntar quais são os riscos ESG. Se a empresa tiver clientes finais, perante dois preços iguais, os clientes vão optar por produtos sustentáveis."

 

O professor catedrático sublinhou ainda que as PME "na Europa estão a fazer quase tudo errado" e que este cenário "só vai ser ultrapassado quando surgirem plataformas agregadoras de dados de PME" como o SIBS ESG: "Aquilo que a SIBS decidiu fazer em Portugal é pioneiro, altamente reconhecido e um esforço aplaudível para que possamos arrumar o mercado ESG das PME."

"Os bancos têm de conhecer bem as empresas que estão a financiar." Clara Raposo, vice-governadora do Banco de Portugal

Grandes empresas e PME com regras diferentes

De acordo com a diretiva CSRD (Corporate Sustainability Reporting Directive), que substitui a anterior NFRD (Non-Financial Reporting Directive), as grandes empresas cotadas vão ter de começar a reportar o desempenho em matéria de sustentabilidade em 2025 (face ao ano fiscal de 2024), enquanto as PME só terão de o fazer em 2027 (face ao ano fiscal de 2026).