O bem-estar animal é fundamental para os setores da criação de animais para consumo e da produção e distribuição agroalimentar. Se não houver boas-práticas nestas atividades, os principais prejudicados são os criadores de animais. Quem o afirma é Movimento Ambiente e Produção Alimentar (MAPA).
"Os animais são seres sencientes, pelo que é reconhecido que são capazes de sentir, de vivenciar sentimentos como dor e stress, entre outros. Ora, na ausência de bem-estar animal, os animais desenvolvem doenças que levam ao aumento de custos e mesmo prejuízos, pois passam a precisar de cuidados médicos, medicamentos e no matadouro podem ser sujeitos a rejeições parciais ou mesmo totais. Por conseguinte, não há dúvida nenhuma de que o bem-estar animal é fundamental para que a atividade se desenvolva adequadamente, sendo os seus criadores os mais interessados na sua aplicação", sublinha Graça Mariano, porta-voz do MAPA.
Os criadores de animais em Portugal estão sensibilizados para o bem-estar animal e conhecem as consequências legais para a sua atividade, caso não sigam as regras. É que – explicam-nos – a legislação europeia é exigente em todos os níveis, nomeadamente neste âmbito, havendo um controlo apertado pelas autoridades competentes a este tipo de atividade. Atividade essa à qual o MAPA prefere referir-se como sendo "criação de animais", em vez de produção animais ou pecuária, uma vez que não se trata só de uma atividade económica, mas sim uma relação próxima entre o homem e o animal. "Há uma entrega total dos cuidadores, que precisam de cuidar dos animais duas vezes por dia. A verdadeira fixação da população ao interior apenas se consegue com a criação de animais, pois estes não podem ser abandonados", recorda Graça Mariano.
Consumidores desconhecem a realidade e não querem pagar mais
Quanto aos consumidores portugueses, terão consciência da importância do bem-estar animal? Graça Mariano lembra que nos últimos tempos foi criada, felizmente, a consciência do bem-estar animal, por se saber que os animais são seres sencientes. Contudo, "os consumidores não sabem que o bem-estar animal tem implicação direta com a rentabilidade e com os custos de criação, pois desconhecem que a aplicação destes requisitos evita doenças dos animais e os consequentes custos com veterinários, medicamentos e rejeições nos matadouros". Por isso, os criadores são os principais interessados na aplicação do bem-estar animal, já que "se não fosse pela relação próxima que mantêm com os animais, seria pela falta de rentabilidade que teriam".
porta-voz do MAPA
A responsável do MAPA acrescenta que os consumidores sabem muito pouco do que já é feito em termos de bem-estar animal, "por falta de comunicação adequada, e em regra ficam admirados quando são confrontados com as exigências regulamentares e com as boas-práticas que os criadores de animais aplicam".
Adicionalmente – prossegue – existem sistemas de certificação voluntária em bem-estar animal que são aplicados em explorações de animais vivos, em transportes e em matadouros. No entanto, estes sistemas voluntários, ainda mais exigentes do que os requisitos impostos pela legislação europeia, acarretam custos mais elevados que se refletem no custo final da carne. "Infelizmente, e apesar de os consumidores estarem conscientes, não estão preparados para pagar mais pelos alimentos sujeitos a certificação voluntária em bem-estar animal. Manifestam interesse no tema à entrada do supermercado, mas depois não adquirem a carne certificada", conclui.
MAPA: ao serviço do mundo rural
O MAPA é um movimento criado com a participação de mais de trinta entidades, direta ou indiretamente, ligadas aos setores da produção agrícola, da criação de animais para consumo e da produção e distribuição agroalimentar. O objetivo do MAPA é, numa só voz, construir de forma positiva mensagens esclarecedoras, que ajudem a clarificar ideias preconcebidas sobre o mundo rural e sobre o seu papel no bem-estar animal, na manutenção, na preservação e no equilíbrio da natureza e na vida quotidiana das pessoas.
No que diz respeito ao papel que desempenha em Portugal para assegurar o bem-estar animal em todo o processo produtivo, o MAPA "pretende divulgar as boas-práticas que já se aplicam na criação de animais, nomeadamente no âmbito do bem-estar, que infelizmente não têm sido do conhecimento da opinião pública". Razão pela qual está agora, finalmente, a dirigir-se aos consumidores, que são os destinatários da comunicação do MAPA.
O MAPA pretende dar a conhecer a importância do bem-estar animal na criação de animais, o qual se reflete na saúde destes, comprometendo-a. "Sem bem-estar animal, não há saúde animal, e, sem esta, existirão custos acrescidos nesta atividade", garante Graça Mariano.
Água, alimentação, espaço e boas camas
Fundado há mais de 100 anos em Sousel, o Pasto Alentejano começou como um pequeno talho na vila alentejana e desde então não parou de crescer, sendo hoje uma referência do país no setor da carne de ovino. Para se ter tornado um sucesso na indústria do borrego, a empresa distingue-se de várias formas, a começar pela verticalidade e responsabilidade no que oferece aos clientes, até porque assumem toda a operação. "Gostamos de explicar que aquilo que vendemos é 100% Pasto Alentejano. Os borregos entram na nossa organização muito cedo, com dois meses de idade. Nas nossas instalações fazemos a seleção, preparação e engorda. Depois, os borregos saem para o nosso matadouro, a um quilómetro de distancia da engorda. Após o abate, a carne é devidamente embalada e preparada na nossa sala de desmancha. E daí servida ao nosso cliente em qualquer parte do mundo", conta Filipe Serralheiro, COO do Pasto Alentejano.
O Pasto Alentejano também se diferencia pelo bem-estar animal que proporciona aos borregos. "Como o José Serralheiro (administrador) diz, o bem-estar animal é na verdade muito simples: água, alimentação, espaço e boas camas. O que na verdade dá muito trabalho é garantir isto todos os dias do ano, feriados, fins de semana, Natal, Ano Novo", recorda Filipe Serralheiro, acrescentando que a empresa tem uma equipa de sanidade para garantir, estudar e desenvolver o que é o bem-estar animal. "Mais, temos as nossas instalações desenhadas e desenvolvidas para o borrego, com todos os fatores em conta, como questões da predominância do vento, chuva ou temperatura da água. E com tanta informação temos também um sistema de gestão implementado para garantir o controlo e subsistência 365 dias por ano", afiança.
COO do Pasto Alentejano
As medidas que têm sido tomadas, fazem com que o Pasto Alentejano possua certificações que provam o bem-estar animal. Quer na produção na engorda, quer a nível industrial, abate e desmancha, garantido assim que toda a cadeia é assegurada e certificada em bem estar animal pela AENOR.
35
Em 2023 a percentagem de exportação do Posto Alentejano fo 53%. Este ano estimam que seja perto dos 60%. A empresa está presente com a sua carne de borrego em 35 países.
Um setor em desenvolvimento
Sobre o setor ovino no nosso país, Filipe Serralheiro diz que deixou de ser o "parente pobre", tendo agora "uma margem de progressão gigante para os próximos anos". O responsável do Pasto Alentejano explica que esta mudança nos últimos cinco ou seis anos ficou a dever-se ao mercado internacional, que veio "criar uma dinâmica e mais valia vertical a toda a cadeia". E à profissionalização industrial, a qual, através de novos artigos e novas formas de apresentar a carne de borrego conseguiu "quebrar a pouco e pouco a sazonalidade do Natal e Páscoa".
Joaquim Capoulas, vice-presidente da CAP – Confederação dos Agricultores de Portugal
"Uma condição essencial para o sucesso"
Os criadores estão obrigados a ter determinado cuidados nas suas produções. A lei e… os consumidores a tal obrigam. Mas para conhecer melhor esta realidade, falámos com Joaquim Capoulas, vice-presidente da CAP – Confederação dos Agricultores de Portugal.
Os nossos produtores têm os animais saudáveis, confortáveis, bem alimentados, com espaço para viver e dormir, até irem para abate? Ou a generalidade das explorações em Portugal estão longe deste cenário?
A tranquilidade, o conforto e a higiene, a alimentação adequada, a ausência de doença, são condições essenciais para o sucesso económico de toda a fileira da carne, desde a produção até ao consumidor. Na produção, independentemente da espécie, qualquer animal só atinge o máximo da sua performance produtiva se todas as condições atrás referidas estiverem reunidas. Qualquer criador consciente sabe disso e se algum não adotou os procedimentos corretos, certamente deixou de ser competitivo e já deixou a atividade. Nos sistemas forrageiros extensivos os animais circulam livremente no campo, com comida e água límpida à disposição em permanência, e descansam nas zonas que escolhem para isso. É função do criador garantir a sua vigilância, para que nada falte, e avaliar a condição sanitária, prevenindo em devido tempo qualquer sinal de desconforto ou doença.
Nas espécies cuja criação só pode realizar-se em meios confinados, os produtores têm o mesmo grau de preocupação, garantindo também que os animais usufruem do espaço necessário e que a renovação do ar circulante é eficaz. Senão, tudo falhará. Existe um Manual do Bem-Estar Animal, elaborado pela CAP e pela DGAV (Direção Geral de Alimentação e Veterinária), onde constam todas as regras que a fileira deve seguir. Apesar de parecer dispensável, pois as condições de criação, de transporte e de abate estão bem assimiladas por todos os operadores, é bom que elas estejam escritas para memória presente e futura.
A legislação em vigor é suficiente?
Existe legislação rigorosa sobre a criação, transporte e abate de animais, que inclui a necessidade de formação de todos os operadores. A legislação que existe é mais do que suficiente, no nosso entendimento. Aliás, o que essa legislação transmite são indicações que sempre fizeram parte daquilo que é uma prática comum de todos os criadores. O bem-estar animal é uma condição essencial para o sucesso.
Os consumidores portugueses já fazem um consumo consciente? E têm consciência da importância do bem-estar animal?
A questão do bem-estar animal tem estado cada vez mais na ordem do dia no espaço mediático. Por isso, importa trazer ao consumidor a informação, por parte da produção, do modo de criação e cuidados seguidos, do meio ambiente em que os animais nascem e vivem, explicando que é do interesse dos criadores reunir todas as condições de tranquilidade que levem a um bom desempenho da atividade. Também é importante desmistificar as más práticas que, por vezes, aparecem na imprensa ao serviço de uma agenda contra o consumo de carne.
Aponte os motivos por que é importante o bem-estar animal?
O bem-estar animal é uma condição essencial ao sucesso da fileira da carne. Na produção, porque é fundamental para a rentabilidade da atividade, e no transporte, para que os animais cheguem sem stress a unidades de acabamento ou centros de abate. Nestes centros é fundamental a ausência de stress, tendo em vista a qualidade da carne. É na distribuição, na relação e no contacto direto com o consumidor, que toda a cadeia é avaliada. A cadeia tem que se preocupar, em conjunto, em comunicar bem passando a informação com eficiência.