À primeira vista, a Code for All e o Grupo MCA não têm pontos em comum. Enquanto a primeira é uma empresa de impacto social que atua na área da educação tecnológica, a segunda opera em vários setores, nomeadamente na construção, na energia, no desenvolvimento urbano, e na saúde.
Apesar de serem organizações com negócios e objetivos distintos, ambas são empresas portuguesas de sucesso, com uma forte componente internacional, e com o desejo de crescerem ainda mais, de forma sustentável. Foi desta vontade de elevação, de melhorar o seu modelo de negócio, e de realizar novas parcerias, que decidiram aderir a este programa lançado pela ELITE, do Grupo Euronext, com o World Trade Center Lisboa, e o BBVA como promotor da iniciativa.
Estivemos à conversa com João Magalhães, cofundador da Code for All, e Paulo Freire de Oliveira, Chief Financial Officer (CFO) do Grupo MCA, para perceber os motivos que os levaram a juntar-se ao programa ELITE e o que esperam alcançar com esta parceria.
“A partilha entre as empresas do ecossistema ELITE ajuda-nos a crescer mais rapidamente e a ultrapassar desafios de forma mais ágil”
Fale-nos sobre a Code for All e as suas principais atividades.
A Code for All é uma start-up de talento tecnológico, e que está desde 2015 a transformar a educação. O nosso negócio é composto por um grupo de três empresas, e posso afirmar que somos a maior escola de talentos e de qualificação na área da tecnologia em Portugal e, provavelmente, uma das melhores da Europa.
A Code for All pretende ser a solução para as pessoas que querem mudar de vida e abraçar uma carreira na área tech, bem como para as empresas que enfrentam desafios nas áreas da transformação digital ou do desenvolvimento de novos produtos tecnológicos. Estamos a resolver um problema de disparidade entre algumas das competências que são atualmente necessárias no mercado de trabalho e as que, efetivamente, existem. Estamos a trabalhar nesta urgência, pois este desfasamento que existe é um problema transversal a todas as áreas, a todos os setores.
Outro dos projetos de que muito nos orgulhamos é o Ubbu, que implementamos em algumas escolas em Portugal e também em outros países, e que é dirigido a crianças entre os 6 e os 12 anos, com o objetivo de as ajudar a desenvolver algumas competências importantes, tais como o pensamento computacional, a criatividade, ou a resolução de problemas.
Como evoluiu a trajetória de crescimento e estratégia de negócios da Code for All ao longo destes anos, especialmente após 2018, quando a empresa se tornou certificada como B Corp?
A Code for All tem vindo a desenvolver-se com bastante sucesso. Temos vindo a crescer e a ganhar presença noutros mercados fora de Portugal. Começámos com uma escola de programação em 2015 e hoje em dia somos uma empresa de talento tecnológico.
Temos projetos e equipas de desenvolvimento de software que estão a trabalhar a partir de Portugal para empresas em várias partes do mundo (Israel, Estados Unidos, Canadá, Países Baixos, Bélgica e Suécia). Na Academia de Código, já temos alunos internacionais que vêm para Portugal fazer os nossos cursos. Na área da educação, estamos com o Ubbu em cerca de vinte países.
E o nosso trabalho tem vindo a ser reconhecido com alguns prémios nacionais e internacionais. Em 2019, fomos considerados pelo Financial Times uma das 100 empresas mais promissoras na área da transformação digital. Este ano, a nossa iniciativa Ubbu ganhou o prémio Empowering Youth in Digital, pela European Digital Awards.
Somos uma empresa “for profit” e “for impact”. E a obtenção da certificação B Corp foi um passo importante para demonstrar que a Code for All tem a sustentabilidade e o impacto social no seu ADN.
Como é que a Code for All se tornou uma parte integral da Academia Internacional do World Trade Center Lisboa by ELITE?
Em 2019, a Code for All participou no programa de aceleração da Euronext TechShare, direcionado a empresas tecnológicas que ambicionam crescer através da utilização do mercado de capitais. Fazer parte deste programa é a oportunidade de dar continuidade a esse processo de preparação para fazer um IPO (oferta pública inicial), mas agora junto de empresas que já estão em fases mais maduras de internacionalização e com ambição de scale up.
Assim, quando a ELITE foi anunciada no mercado português, vimos uma oportunidade de fazer parte desta rede internacional de empresas, que facilita o acesso a um conjunto de ferramentas e pode impulsionar o nosso percurso internacional. Portugal é um ótimo país para começar o negócio, mas o desafio da internacionalização para as PME surge muito rápido dada a reduzida dimensão do país.
Quais são os objetivos específicos que a Code for All pretende alcançar ao tornar-se parte deste programa?
Por um lado, o programa ajuda-nos a pensar e definir a estratégia da empresa. Por outro, a aceder a financiamento – em Portugal pode ser difícil aceder a novas formas de financiamento ou a outro tipo de investidores. Por fim, na partilha de experiências com empresas com alguma escala internacional que pode contribuir para a aceleração dos nossos próprios processos.
Recentemente, participou como orador num workshop sobre ESG e sustentabilidade em Paris. Quais são os principais impulsionadores do crescimento sustentável da Code for All e como estão a preparar-se para o futuro?
A sustentabilidade e o impacto social fazem parte do nosso ADN. O que fazemos é dar novas competências às pessoas para que tenham um futuro melhor e mais sustentável. Um dos pontos que abordei no workshop foi o desafio com que nos vamos deparar – e que já começamos a sentir: segundo um estudo do World Economic Forum, há mil milhões de pessoas que terão de ser requalificadas até 2030. Assim, há muitas pessoas que vão ter de se reinventar. Obviamente irão surgir novas profissões que ainda desconhecemos, mas uma coisa sabemos: a tecnologia vai continuar a ter um papel preponderante quaisquer que sejam essas novas ocupações.
É desta forma que a Code for All, como empresa, está a tentar impactar e preparar o futuro.
Como é que fazer parte de um ecossistema internacional com mais de 1.500 empresas pode ser valioso para a Code for All?
Como empresa, temos de nos adaptar e aprender constantemente e rapidamente. Este crescimento acontece não só através da nossa experiência, mas também da aprendizagem resultante da experiência de outras empresas, de outros empreendedores que estão noutros países, em outros setores, e em outros contextos. Esta partilha entre as empresas ELITE ajuda-nos a crescer mais rápido e a ultrapassar desafios de uma forma mais ágil.
A partir da experiência e perspetiva da Code for All, qual é a importância do ecossistema ELITE para as PME em Portugal?
Eu acredito ser uma oportunidade incrível para Portugal. Quando estivemos no evento em Paris sobre sustentabilidade confirmámos que o ecossistema ELITE está num momento muito forte: há novos membros a aderir, o que é uma oportunidade interessante para Portugal. Na minha opinião, este movimento vai ganhar uma escala com uma dimensão muito interessante e abrangente na Europa.
Como é que a participação neste programa pode apoiá-los na busca de novos níveis de competitividade?
O World Trade Center Lisboa International Academy by ELITE pode ajudar não só no networking, mas também na partilha de conhecimento, construção da estratégia, e acesso a novas formas de financiamento. Acredito ainda que nos facilita a descoberta de novos mercados, crescimento, e no desenvolvimento do negócio. Estarmos dentro de uma rede de empresas com experiências muito diferentes, com perspetivas diferentes, presentes em mercados diferentes, é, por si só, uma mais-valia para a partilha de informação que pode ser útil para ultrapassar diferente desafios.
Existem planos ou iniciativas futuras da Code for All que venham a assentar nas experiências e aprendizagens obtidas com este programa?
Sem dúvida. Apesar de ser recente, nós já tivemos a oportunidade de participar em duas iniciativas: uma sobre estratégia e outra sobre sustentabilidade, em que estiveram empresas de outros países com inputs muito interessantes sobre a forma como gerem os seus negócios. Neste momento, já estamos a incorporar alguma dessa informação na nossa gestão do dia a dia.
“A ELITE abre a mente das empresas para novas oportunidades e para a internacionalização”
Pode fornecer uma visão geral do Grupo MCA? Quais são as atividades principais e as áreas de especialização?
O Grupo MCA foi criado em 1998 em Guimarães, pelo empresário Manuel Couto Alves. Inicialmente, a atividade focava-se sobretudo na construção de infraestruturas clássicas, como estradas ou obras marítimas, mas rapidamente nos apercebemos que era importante diversificar.
Atualmente, além das infraestruturas, temos mais três verticais: a energia, o desenvolvimento urbano e a saúde. São quatro verticais diferentes, mas que se complementam. Não só diversificámos em termos de linhas de negócio como também na cadeia de valor destes negócios.
Ou seja, se no início nos dedicávamos apenas à construção de infraestruturas, hoje em dia, para cada um dos quatro verticais, temos uma cadeia de valor mais ampla, fazendo desenvolvimento, engenharia, procurement, construção e operação. Estamos presentes em três clusters geográficos: na Península Ibérica, em África, com uma forte presença em Angola, e no centro da Europa, na Alemanha e Polónia, onde temos alguns projetos.
Ao longo do tempo fomos diversificando geograficamente. A empresa começou em Portugal, em 2006 expandiu para a África Lusófona, em 2008 iniciamos em Espanha a nossa atividade de desenvolvimento urbano, e há cerca de dois anos abrimos a nossa filial na Alemanha, onde estamos agora a desenvolver uma série de projetos.
Neste momento, a atividade nacional pesa cerca de 10% do negócio. A empresa diversificou-se muito.
Porque é importante para o Grupo MCA estar presente nesses países?
Muito importante. O mercado português tem a dimensão que tem e, para irmos mais além, naturalmente temos de internacionalizar. Mas também por risco. A diversificação geográfica ajuda a mitigar e gerir melhor o risco. Portugal continua a ser uma peça muito relevante, com muita massa cinzenta e muito conhecimento produzido pelos nossos engenheiros. É uma boa exportação que fazemos desse conhecimento para ser implementado nos projetos, quer seja o biogás na Polónia, o biometano na Alemanha ou as nossas plataformas logísticas em Espanha. Essa expansão permite que Portugal, apesar de só pesar 10%, seja um core muito importante para o nosso negócio.
Este ano, o Grupo MCA celebrou o seu 25.º aniversário. O que isso significa para a empresa?
É sempre um marco importante. Representa crescimento, uma evolução constante. A internacionalização é essencial para que haja um crescimento sustentável. O país tem uma dimensão reduzida, portanto, se as empresas querem ser mais ambiciosas têm de se expandir – e nós fizemos esse trajeto. Temos estado a diversificar setores e geografias, medindo e controlando o risco. Com esta evolução da dimensão da empresa foi muito importante termos desenvolvido um sistema de governance e compliance bastante forte na empresa. Isso é algo que nos orgulha muito e que nos permite olhar para os próximos 25 anos como uma continuação deste crescimento e de novas oportunidades que possam surgir e é para isso que cá estamos.
O que motivou o Grupo MCA a juntar-se à Academia Internacional do World Trade Center Lisboa by ELITE?
Quando me apresentaram a ELITE, achei, desde o primeiro momento, que a proposta de valor era muito atrativa. Incluía a parte de formação, que é sempre importante. Muitas vezes ficamos muito focados no nosso dia-a-dia e não pensamos nas coisas mais abrangentes. O networking das empresas que fazem parte do ecossistema ELITE, seja nacional ou internacional, e a preparação para o acesso ao mercado de capitais, privado ou público, também são muito importantes. O paradigma das taxas de juro zero acabou. Por isso, temos de ser mais imaginativos, o que é um desafio adicional para as empresas.
Essas três valências – formação, networking e mercado de capitais – carimbadas pela credibilidade da Euronext, fizeram com que não tivéssemos de pensar muito para decidir fazer parte deste grupo.
Como é que o Grupo MCA pode beneficiar do programa para financiar os seus planos de crescimento e internacionalização?
A ELITE criou instrumentos muito interessantes em Itália, nomeadamente o Basket Bond ®, que é um pacote que engloba dívida de uma série de empresas, conferindo-lhe uma dimensão mais atrativa para os grandes investidores institucionais. Esta é uma iniciativa interessante de trazer para Portugal, eventualmente com o apoio de parceiros institucionais portugueses. As empresas mais pequenas não podem estar apenas dependentes dos bancos. A diversidade de fontes de financiamento é importantíssima para a sustentabilidade dos projetos e das empresas. Nós temos uma série de projetos que necessitam de financiamento e é sempre bom ter alternativas. Não devemos colocar os ovos todos no mesmo cesto.
O ecossistema ELITE – Grupo Euronext abrange toda a Europa, contando agora com mais de 1.400 membros que geram mais de 100 mil milhões de euros. Como pretendem aproveitar esta rede para crescer?
A partilha de experiências com outras empresas semelhantes traz muito valor acrescentado. Podemos aprender, evitar erros que outros fizeram, e replicar coisas bem feitas, o que nos permite crescer mais rápido e de forma mais sustentada. A ELITE promove não só o intercâmbio de ideias entre as empresas locais, mas também com as outras empresas no resto da Europa, em Itália ou nos Países Baixos, por exemplo. O evento anual da ELITE que decorrerá em outubro em Milão vai ser uma oportunidade excelente para falar com pessoas que estão no mesmo estágio de desenvolvimento, ou mais atrasados, ou mais adiantados, para podermos partilhar experiências. A vantagem da Academia Internacional do World Trade Center Lisboa by ELITE é que abre a mente das empresas para novas oportunidades e para a internacionalização.
Como veem o panorama económico atual para as PME em Portugal?
Claramente o panorama é desafiante. Vivemos anos de financiamentos com taxas de juro muito baixas e isso, à partida, acabou. Agora voltámos à normalidade e um programa como o World Trade Center Lisboa International Academy by ELITE permite que as empresas pensem melhor na necessidade de internacionalização, por questões de risco e de crescimento. É necessário diversificar e aceder ao mercado de capitais pontualmente ou recorrentemente para formas de financiamento, sejam elas de dívida ou de equity, e também ensinar as PME que é essencial terem modelos de governação sólidos e bem estruturados. Não há razão para que o modelo de governação de um grupo empresarial, apesar de não ser cotado, não seja semelhante às exigências dos cotados. Na MCA temos um modelo de governação forte, com criação de valor para os seus stakeholders. O mundo financeiro mudou – ou normalizou – e certamente a ELITE e os seus parceiros World Trade Center Lisboa e BBVA vão-nos ajudar a navegar nesse mundo.
A sustentabilidade e a inovação são impulsionadores fundamentais do crescimento no mundo empresarial atual. Como é que o Grupo MCA integrou esses dois aspetos na sua estratégia?
A sustentabilidade está enraizada no nosso propósito e na nossa estratégia. Temos feito um trabalho relevante e alinhado com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas, em que após uma reflexão interna profunda, identificámos os cinco ODS que materialmente nos impactam e nos quais a nossa atividade tem impacto mais significativo. Isso foi um trabalho de background muito importante que definimos e agora estamos a medir. Publicámos o nosso primeiro relatório integrado, relativamente ao ano de 2022, que integra questões de sustentabilidade com as questões financeiras, sobre as quais medimos o impacto da nossa atividade. Esta medição hoje em dia ainda não é fácil, sobretudo devido à disponibilidade de dados, mas estamos a fazer esse caminho.
Relativamente à inovação, temos de acompanhar as exigências dos nossos clientes e inovar, para lhes dar soluções cada vez mais eficientes, nomeadamente ao nível da energia. O desenvolvimento tecnológico é constante e temos de estar na crista da onda. É muito importante, tendo em conta as diversas geografias onde estamos presentes, garantir que essa inovação se adequa a cada uma das geografias. É inovar criando soluções que se adequam a cada uma das geografias.
Podem partilhar alguma conquista notável da história do Grupo MCA que destaque o impacto que tiveram nas empresas com as quais trabalharam?
Temos projetos cada vez mais importantes. Por exemplo, iniciámos no princípio do verão um projeto novo de eletrificação rural em Angola. Vamos levar eletricidade a comunidades rurais e isoladas. É um projeto de mil milhões de euros que foi financiado por bancos europeus, com a garantia da Agência Exportadora Alemã (Euler Hermes). É um projeto que deve estar concluído nos próximos três anos e que vai impactar um milhão de pessoas, o equivalente a cerca de 10% da população portuguesa. Energia sustentável, com geração solar, e permanente que lhes vai transformar as vidas. Isto é um impacto brutal. É algo que nos orgulha muito, são 60 comunidades rurais, 200 mil casas, é um milhão de pessoas que vão passar a ter aquilo que para nós é um dado garantido e que até agora era algo muito intermitente e que dependia de geradores a gasóleo.
Também vai impactar empresas, porque as baterias e os sistemas de controlo e de management das baterias serão totalmente europeus. Numa altura em que se fala da reindustrialização da Europa, este projeto será muito importante, por isso, tem tido o apoio dos governos europeus para o seu financiamento.
Questão de conclusão: porque é que a ELITE pode ser a oportunidade game-changing que as empresas portuguesas, tal como o Grupo MCA, devem considerar?
Além da formação, do networking e do acesso ao mercado de capitais, a ELITE abre a mente das empresas. Muda a mentalidade e foca-se em temas relevantes, como a governação, que dá confiança aos stakeholders financeiros e não financeiros.
A ELITE traz ambição às empresas, obriga-as a pensar em horizontes mais amplos para que deixem de ser PME e passem a ser grandes empresas. Acho que a ELITE está a querer incutir essa mentalidade de crescimento, que muitas vezes nos falta. E com o apoio de instituições como a Euronext, o World Trade Center Lisboa ou o BBVA, que nos dão a credibilidade de que as coisas são feitas e estruturadas de forma sustentável.