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05 de Agosto de 2005 às 13:59

As comissões de Valério

No centro do furacão que devora as instituições brasileiras está Marcos Valério Fernandes de Souza. Este empresário, agora conhecido como o homem da mala preta que geria a distribuição do «mensalão», afirma que 55,8 milhões de reais (19,5 milhões de euros

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Marcos Valério sustenta a sua denúncia numa detalhada lista de pagamentos, presumidamente sacados do Banco Rural, da qual constam 74 nomes, entre 31 clientes e 43 nomes autorizados a fazer levantamentos.

Porém, depois do cruzamento entre os dados da lista e as informações bancárias, a comissão de inquérito não conseguiu identificar quem levantou cerca de 38,5% do valor referido por Marcos Valério. Pela simples razão de que muitos dos levantamentos foram feitos sem obediência às regras impostas pelo sistema financeiro.

Por outro lado, estará provado que vários levantamentos terão sido feitos por funcionários de Marcos Valério que, por sua vez, procederiam a pagamentos em mão.

Em consequência, diante da impossibilidade de fazer prova definitiva sobre quem recebia o dinheiro, nenhuma das 74 pessoas constantes da lista de Marcos Valério saiu ilibada. E, à medida que vão sendo ouvidas testemunhas e envolvidos, como é o caso decisivo de Roberto Jefferson, a lista de nomes vai crescendo e a trama vai ficando mais densa.

Ao todo, desde membros do Governo a deputados, de membros do Banco do Brasil e Casa da Moeda aos Correios, já caíram 36 titulares. Na Câmara correm pedidos de cassação de mandatos sobre 14 deputados. As demissões, o rolar de cabeças, as acusações e a desconfiança caracterizam agora o estado da política brasileira.

Inevitavelmente, o Brasil está praticamente ingovernável. Vive uma das suas maiores crises políticas e ninguém sabe dizer quem mais vai ser envolvido e como tudo se irá resolver. O presidente Lula, cuja eleição abriu um mar de esperança para milhões de brasileiros, vê o seu mandato condenado por um escândalo que no imediato minou a sua base política parlamentar e seguidamente minará a sua base eleitoral. Até no plano internacional, a credibilidade do Brasil ficará afectada por muito tempo.

Lamentavelmente, empresas e gestores portugueses com importantes interesses no Brasil acabaram por ser atingidos pela tempestade. Apesar dos desmentidos dos visados e de os próprios orquestradores afirmarem que nenhuma empresa portuguesa colaborou nos esquemas de financiamento dos partidos, a suspeita foi lançada e, como uma nódoa, dificilmente será removida. Sobretudo porque muitos se interrogam sobre a possibilidade de realizar negócios no Brasil sem sujeição aos seus esquemas ilegais de pagamentos de comissões. Comissões que se diluem depois pelas algibeiras de quem «ajudou» a concretizar as operações.

Apesar disso, não só no Brasil, as comissões continuam a fazer parte decisiva do comércio e investimento internacional. Mas uma coisa são as comissões de Marcos Valério e outras são as comissões contratuais. Uma empresa que segue um código de ética saberá sempre decidir correctamente entre as duas.

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