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Se os despedimentos são mais flexíveis porque é que a precariedade não desce?

Para alguns economistas, é a protecção aos contratos permanentes que explica o elevado nível de precariedade. Mas cinco anos depois das mudanças da troika o nível não baixou.

Bruno Simão/Negócios

Quando em 2011 um empregador contratava um trabalhador para o quadro, sabia que se mais tarde o quisesse despedir teria de pagar cerca de um mês de salário por cada ano trabalhado. Hoje, sabe que esse custo baixou para quase um terço: 12 dias por ano. O emprego está a recuperar, mas as contratações sem termo não crescem a um ritmo que permita baixar os níveis de precariedade. 

Portugal é há vários anos o terceiro país da União Europeia com maior proporção de contratos não permanentes e para grande parte dos economistas a principal explicação é o elevado nível de protecção dos contratos sem termo.

As reformas laborais da troika permitiram escolher o trabalhador a despedir quando é extinto o posto de trabalho com base em critérios como a avaliação (e já não em função da antiguidade), alteraram o despedimento por inadaptação (que quase não é utilizado) e baixaram substancialmente as compensações a pagar em qualquer despedimento lícito (muito comuns), levando a OCDE a reduzir este clássico indicador de "rigidez", muito utilizado nas comparações internacionais.

Em todas as dimensões relevantes, deram-se pequenos passos de aproximação ao sistema europeu.PEDRO PORTUGAL
Economista


Apesar disso, entre 2011 e 2016, o peso dos contratos não permanentes no sector privado subiu todos os anos, de 26,5% para 33,5%, de acordo com os quadros de pessoal.

Não seria expectável que, quatro ou cinco anos depois da aplicação da reforma desenhada pelo FMI e pela Comissão Europeia, os empregadores tivessem agora menos incentivos para contratar a prazo?

"Não chega"
A primeira resposta a esta questão é que as reformas não foram suficientemente ambiciosas. "Os empregadores em Portugal ainda têm fortes incentivos para contratar a prazo. Por isso não devemos estar absolutamente surpreendidos com o que estamos a ver", afirma ao Negócios Stijn Broeck, economista da OCDE. Num relatório publicado no ano passado, a instituição reconhece uma "significativa redução" na protecção de trabalhadores permanentes, mas continua a classificar Portugal como um dos países com maior rigidez. Apesar de ser muito fácil avançar para um despedimento colectivo.

"Em todas as dimensões relevantes, como a protecção no emprego, deram-se pequenos passos de aproximação ao sistema europeu", sustenta o economista Pedro Portugal.

Para João Cerejeira, professor na Universidade do Minho, o problema é que as reformas desenhadas pela troika alteraram mais as compensações por despedimento do que o próprio processo. "A incerteza associada a um despedimento colectivo mantém-se." Tanto a nível do resultado como do tempo que os tribunais demoram a resolver essa questão. Os empregadores valorizarão mais o segundo aspecto, sugere.

O economista da Universidade do Minho acrescenta, contudo, que as explicações para o elevado nível de precariedade não se esgotam na legislação.

O facto de o país ter uma estrutura empresarial de pequenas e médias empresas, "muito preocupadas com o curto prazo", em sectores como o turismo e a restauração, que têm um forte elemento sazonal, também explica esse peso.

A conversa não começou por aqui, mas João Cerejeira também acrescenta que acredita que, num cenário de crescimento, é mais provável que as medidas que o Governo tem em cima da mesa – como a redução da duração ou renovações dos contratos a prazo – sejam eficazes, levando os empregadores a transformar contratos a termo em contratos sem termo.

Pela lógica descrita, enquanto existirem dois tipos de contratos (com graus de segurança diferentes) o incentivo à contratação a prazo não vai desaparecer. A equiparação total de condições contratuais, que chegou a ser discutida em vários países europeus com o nome de "contrato único", gerou desconfiança e não foi levada a sério pelos decisores políticos. Talvez seja difícil chegar a acordo sobre o "grau único" de protecção a garantir.

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